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Khaled é um menino pobre que vive na periferia de Cabul, capital do Afeganistão. Todas as manhãs ele observa soldados passarem em frente a sua casa, é bem verdade que pouco ou nada sabe além de que aqueles oficiais com armas em punho são soldados do governo americano.
Do outro lado, John, menino de classe média que vive na ilha de Manhattam, todas as manhãs passa ao lado donde foi o WTC, é bem verdade que ele pouco ou nada sabe além de que ali houve um atentado terrorista que matou um “monte de gente” da sua cidade.
Da família de Khaled sobraram somente a mãe e dois tios que há alguns anos imigraram com ele para Cabul depois que o restante da família foi dizimado no Líbano numa retaliação do exército de Israel por causa dos conflitos de fronteira daquela região. É bem verdade que Khaled não sabe a distância do Líbano pro Afeganistão, e nem o porquê dos soldados israelenses terem matado seu pai e familiares. Ele supõe que seja ódio, pois considera o povo judeu assim como o americano, uns hereges, verdadeiros filhos de Satã.
A família de John é muito grande, mas ele não se conforma de ter perdido a mãe num dos aviões sequestrados no fatídico 11 de setembro. É bem verdade que ele ainda não entende como o homem consegue voar de avião e nem o verdadeiro motivo dos terroristas em colidir com os aviões nas torres gêmeas. Ele supõe que seja ódio, pois considera o povo do Islã uma gente fanática e atrasada que vive na miséria, e mais, que eles têm inveja dos americanos.
No entanto, Khaled considera seu povo abençoado por Deus, sabe que Allah será justo com ele no juízo final. Agora, John considera seu povo grandioso e ficou muito, mas muito orgulhoso quando ouviu de seu avô a história de como a América se transformou na grande potência mundial.
Khaled não sabe que parte da sua gente matou muitas outras gentes em nome de Deus, escrevendo e manchando com sangue o destino de outras famílias. Nem John sabe que seu governo financiou governos ditatórios e até, pasmem, organizações terroristas quando estas serviram a seu tal interesse de Estado.
Longe deles, Marcinho, menino pobre que vive na periferia de Ribeirão Preto, interior de São Paulo, observa todas as manhãs, traficantes passarem em frente a sua casa, é bem verdade que ele pouco ou nada sabe que aqueles “caras” com armas em punho fazem parte de uma organização criminosa; pra ele, são gente da comunidade. Marcinho não sabe quem matou seu irmão, ou por quê o mataram. Alguns dizem que ele morreu num confronto com a polícia. Ele supõe que seja ódio o que sente pela polícia, que ao seu ver, quando pode, maltrata o povo pobre da periferia.
Khaled, John e Marcinho não sabem ou sabem muito pouco ou até mesmo nunca saberão, que crianças da idade deles morrem de fome, bala perdida e de doenças infecciosas por todo o mundo por displicência de governos corruptos e exploradores da sua gente e de outras. Seus destinos e heróis são outros. O que eles têm em comum é a contemporaneidade de um mundo que diverge por interesses dos mais escusos -dinheiro, religião, status, e etc - na ganância pelo poder, e que, esse mundo reserva aos seus filhos o mesmo espólio doentio do ódio.
(*) CARLOS BIASOLI escreve para HiperNotícias.
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