Você já ouviu falar nos linfócitos T reguladores? Provavelmente não. Mas pode ter sentido, no próprio corpo ou em alguém próximo, o que acontece quando eles falham: tireoidites, lúpus, psoríase, esclerose múltipla, doenças intestinais inflamatórias, entre tantas outras pressões da autoimunidade.
Foi por desvendar os genes e mecanismos que regulam esse equilíbrio delicado que o Prêmio Nobel da Medicina de 2025 foi concedido. Mas há uma pergunta que ficou fora dos holofotes: por que o nosso sistema imunológico, que evoluiu por milhões de anos para nos proteger, está cada vez mais desregulado — atacando a si mesmo?
Essa é uma pergunta que não se responde apenas com ciência de laboratório. Ela exige que olhemos para o mundo ao nosso redor — e para o modo como estamos vivendo.
Nos últimos 30 anos, os diagnósticos de doenças autoimunes dispararam. Já se fala em uma epidemia silenciosa. Mulheres jovens, crianças, pessoas produtivas — corpos antes saudáveis entrando em ciclos de inflamação, fadiga, dor e confusão clínica. O sistema imune, que deveria ser guardião, se torna agressor.
Mas não é ele o inimigo. É o ambiente que o tem colocado em xeque.
O que estamos respirando, comendo, sentindo, dormindo, acumulando — tudo isso fala com os nossos genes. E essa conversa pode silenciar os mecanismos que regulam a tolerância imunológica.
Esse é o campo da epigenética: onde o estilo de vida, o estresse, os agrotóxicos, os ultraprocessados, os plásticos, a solidão, a poluição e o sono destruído moldam a forma como nossos genes se expressam — ou se calam.
A ciência premiada pelo Nobel é uma conquista. Mas o seu maior valor pode estar em nos lembrar de algo ainda mais urgente: não basta mapear os caminhos da cura se continuamos pavimentando os trilhos da doença.
É tempo de falar de prevenção com seriedade. De pensar a saúde como um ecossistema — onde corpo, mente e ambiente não se separam.
A autoimunidade talvez não seja apenas uma falha do corpo. Talvez seja o corpo respondendo, de forma desesperada, a um mundo cada vez mais inflamado.
Que o Nobel seja, então, um alerta: a biologia já falou. Agora é a sociedade que precisa escutar.
*LUIZ GUEDES BARBOSA é médico reumatologista
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