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Artigos Sexta-feira, 11 de Novembro de 2022, 14:17 - A | A

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Sexta-feira, 11 de Novembro de 2022, 14h:17 - A | A

JOSUÉ MARCILIO

Direitismo, a doença decrépita do autoritarismo caduco

JOSUÉ MARCILIO

Reprodução/Assessoria

JOSUÉ MARCILIO

 

Passamos por momentos de tensão em decorrência da transição entre dois governos: o atual, que abriga indisfarçavelmente tendências reacionárias e retrógradas, até mesmo fascistóides, e o outro, democraticamente eleito, que, a despeito de falhas grosseiras e radicalismos infantis, está mais identificado com as aspirações populares e o funcionamento normal da cultura e raízes históricas e sociais do país.   

Tanto o fascismo como o nazismo, ideologias que foram praticadas no século passado, se caracterizam por um nacionalismo exacerbado com componentes vitimistas, com violência aos vistos como “inimigos”, exaltação de valores como a pátria ou a raça para manter permanentemente mobilizadas as massas, a opressão de minorias e da oposição política, e um forte militarismo. Os dois fazem discriminações de pessoas, distinguindo entre raças ou classes “inferiores” e “superiores”, sob o pretexto de se fundamentar em teorias “científicas”. As manifestações populares espontâneas, artísticas e culturais em geral, passam por um controle e submissão à visão de mundo dos detentores do poder – no que a extrema direita é muito parecida com a extrema esquerda. Não é respeitada por essas tendências a diversidade entre pessoas, nem tolerada a divergência de idéias, opiniões, filosofia ou religião.   

No Brasil, antes do “movimento” de 1964, tivemos uma ditadura com traços fascistas entre 1930 e 1945. Getúlio Vargas, o ditador, costumava dizer “A lei, ora a lei”, o que, não por casualidade, tem iniludível semelhança com o atual mandatário da República, que pretende se sobrepor à Constituição, a qual jurou cumprir e fazer cumprir por ocasião da posse, e aos outros poderes legalmente constituídos. 

Ativismo Judicial  

Recentemente se tem falado em ativismo judicial para designar um movimento ou uma agitação que pretende questionar a ação da justiça, do poder Judiciário, na democracia, com referência aos deslizes ou desmandos do chefe de Estado. Até a atual dirigente do STF, Rosa Weber, ao ser empossada em setembro passado, mencionou esse “ativismo judicial” que, numa posição indefensável, procura ignorar ou fazer vista grossa da Constituição vigente.    

No livro Juízo à Exclusão, de César Garavito e Diana Franco, o que é chamado ativismo judicial dialógico é a atuação dos tribunais no sentido de fazer cumprir direitos dos cidadãos por governos incompetentes ou omissos. Na Colômbia, por exemplo, a sentença T-025, a CCC – Corte Constitucional Colombiana, suprema instância do Judiciário naquele país – determinou que o governo deveria dar assistência à população deslocada por grupos guerrilheiros. Na África do Sul, uma sentença similar determinou que o governo oferecesse habitação à população carente. Na Índia, uma sentença determinou que o governo fornecesse alimentação à população faminta.   

O livro, um entre os diversos que estão sendo lançados no mercado editorial internacional, trata das intervenções da justiça com o objetivo de garantir os direitos dos excluídos. Os autores questionam o posicionamento daqueles que argumentam que os juízes não têm legitimidade para interferir nas decisões governamentais porque não foram “eleitos pelo povo”. Entre os argumentos apresentados em favor dessas intervenções judiciais, dizem os autores:

... com respeito à responsabilidade democrática dos tribunais, nosso estudo toma como ponto de partida a realidade da prática institucional nas democracias realmente existentes. Neste contexto, o estudo mostrou que os tribunais podem aprofundar, em vez de corroer, a governança democrática ao atuar como fontes de prestação de contas horizontal, isto é, mediante a liberação dos bloqueios entre e dentro de organismos públicos que estão quase isentos de prestar contas aos cidadãos e pressionando os funcionários públicos para que se ocupem das deficiências sistêmicas da política pública que levam a violações massivas dos DESC [direitos econômicos, sociais e culturais]. 
   

Nas duas últimas décadas – prosseguem eles – os tribunais, os ativistas e os acadêmicos do Sul Global têm desenvolvido teorias, estratégias e doutrinas cujo propósito é cumprir a promessa dos direitos econômicos, sociais e culturais em contextos caracterizados pela exclusão radical e pelas desigualdades inaceitáveis. Junto com desenvolvimentos paralelos no Norte Global, estas inovações jurídicas têm sido contribuições fundamentais ao constitucionalismo comparado e aos direitos humanos internacionais.   

O que está se verificando no Brasil poderia ser denominado, mais propriamente, ativismo antijudicial. O direitismo é antipovo, antiético e antiecológico.

Antecedentes

Em abril de 1964, um grupo de militares perpetrou um golpe de estado, sob o pretexto de prevenir um golpe comunista, com o apoio da CIA, agência americana de espionagem. O perigo de que os “comedores de criancinhas”, financiados pelo “ouro de Moscou” se apoderassem do poder era muito remoto; as esquerdas brasileiras estavam tão desarticuladas e desnorteadas quanto estão hoje. A ditadura que se instalou no Brasil, posteriormente “exportada” para outros países latino-americanos – por exemplo: ao Chile com o “suicídio” de Allende e Pinochet assumindo um mandato vitalício, ou que tal se pretendia; à Argentina, que fez desaparecer uma quantidade de pessoas e em conseqüência ocorreu o manifesto das mães na Plaza de Mayo; ao Paraguai, com Stroessner, etc. – cassou, perseguiu, matou (p. ex., Vladimir Herzog), censurou e tentou paralisar a cultura, como Hitler na Alemanha, nas décadas anteriores.   

A ditadura ocupou o poder durante 20 anos, praticando o arrocho salarial, aumentando a brecha entre pobres e ricos, criando um clima de insegurança nacional (em nome de uma “segurança nacional” que contemplava um grupo reduzido) e deu um tratamento subalterno à educação e à cultura.    

Comentando o que ocorreu em 1968, o escritor mexicano Carlos Fuentes afirma que o momento histórico era de um recrudescimento do autoritarismo tanto pelo lado ocidental como oriental. O que Carlos Fuentes denominou “vitória de Pirro”, ou seja, uma vitória que as classes dominantes do mundo obtiveram no momento, mas que a longo prazo se revelaria como uma derrota, ainda estava em seu primeiro momento, e as forças reacionárias, tanto do bloco soviético como das correntes ditas “liberais” estavam em pleno vigor, em resposta aos movimentos libertários de 1968 em pelo menos três países: França, México e na então Tchecoslováquia.   

Ao contrário do que querem fazer crer alguns nostálgicos da ditadura, os crentes na “ditabranda” e outros pelo estilo, aqui estão alguns dados quantitativos do que ocorria no Brasil nos “anos de chumbo”, fornecidos por Marcos Napolitano em 1964: História do Regime Militar Brasileiro (citando J. Teles): 50 mil presos nos primeiros meses do regime; 7.367 pessoas acusadas nos termos da Lei de Segurança Nacional (10.034 inquiridos); 130 banidos; 4.862 cassados; 6.592 militares punidos; 388 mortos e desaparecidos (426 se contados os que morreram por seqüelas da tortura no exterior); milhares de exilados, além de lideranças camponesas assassinadas em conflitos políticos e agrários, e milhares de indígenas mortos por ações do Exército na Amazônia, conforme denúncia recente da imprensa. (NAPOLITANO, 2014, p. 345, nota 194.)   

A par desse quadro de repressão, havia uma propaganda ativa do governo, em que se buscava estimular a euforia e o ufanismo pátrios por viver numa “ilha de paz e prosperidade” em meio a um mundo conturbado. Foram os anos do “milagre brasileiro”. O suposto milagre, segundo os defensores do regime, foi que, em menos de dez anos, o Brasil, que era o 64º PIB mundial, passou a ser a décima economia do planeta. Mas, como afirma Napolitano, este “salto” não foi de graça:

Nenhum historiador sério, mesmo mais à direita, questiona que o desenvolvimento sem democracia imposto pela ditadura militar teve um alto custo social. O salário mínimo teve uma perda real de 25% entre 1964 e 1966, e 15% entre 1967 e 1973. A mortalidade infantil não caiu no ritmo esperado para uma potência econômica em ascensão (131/100 mil em 1965, 120/100 mil em 1970, e 113/100 mil em 1975). Já foi dito que não se faz omelete sem quebrar os ovos. Neste caso, os ovos eram os trabalhadores mais pobres e desqualificados que garantiam a mão-de-obra barata no campo e na cidade (NAPOLITANO, 2014, p. 149).

Gilberto Cotrim, em História do Brasil: Um Olhar Crítico, complementa:

Entretanto, o “milagre” durou pouco, pois não se baseava num crescimento auto-sustentado. O desenvolvimento brasileiro estava diretamente condicionado a uma conjuntura internacional favorável e à tomada de empréstimos de bancos estrangeiros. Ao desaparecer essa situação favorável, com o aumento do preço do petróleo no mercado internacional (1973), a economia brasileira sofreu grande impacto. A inflação começou a subir e a dívida externa cresceu de forma assustadora (COTRIM, 1999, 341). 

Pois bem, mas enquanto durou, euforia era a palavra de ordem. Euforia por viver num país que era a décima economia do planeta, mesmo sem comida na panela, foguetórios quando o Brasil se tornou tricampeão mundial de futebol, e quem não estivesse contente que se mandasse, era amar ou deixar o país, entendido esse amor à pátria como a aceitação passiva do regime imposto. Um manual de Moral e Cívica editado em 1977 define o “amor à Pátria”, que segundo a autora é “dever do cidadão”, como “a disposição de fazer pela Pátria os sacrifícios necessários”, prestando serviços não só dentro dos limites da lei e da justiça, mas também com amor e generosidade.   

Esse amor à pátria, esse “morrer pela pátria e viver sem razão” vinha aliado à euforia que todo brasileiro deveria sentir pelo “milagre brasileiro”, “nunca fomos tão felizes”, etc.    

A mentalidade escravagista, ou feudalista, predominante em grande parte das elites brasileiras, tem hoje um representante no Palácio da Alvorada. A política que vem sendo implementada privilegia alguns grupos e ignora os problemas brasileiros. O custo de vida se eleva, a saúde é desatendida, a educação tem verbas reduzidas.   

E a segurança? Quando assumiu, o presidente pretendia distribuir armas à população. Com as melhores intenções. Já que a polícia e o Exército não conseguem dar segurança, a população que se defenda. Parece que as intenções esbarraram em entraves legais, ou fosse por que fosse, o projeto foi engavetado.   

Por ocasião da pandemia, a vacinação foi mais ou menos boicotada, ou dificultada pelo governo. Também com as melhores intenções. O que se pretendia era proteger o povo dessas substâncias que são inoculadas nas pessoas, vindas de não sei onde, da China (onde se originou a moléstia) ou de pessoas que manipulam veneno de cobra.   

Logo depois do primeiro turno das eleições, foi anunciado um corte na verba da educação. As intenções também são as melhores. O povo não precisa de educação, precisa de esmola. Umas esmolas para o povo podem significar mais alguns votos no segundo turno.

Mas ainda resta uma esperança. Em 1962, Ferreira Gullar escreveu uns versos que continuam atuais:
Quem faz café virar dólar

 e faz arroz virar fome 

é o mesmo que põe a bomba

suja no corpo do homem. 

E em 1981, Milton Nascimento e Fernando Brant cantavam:

Aqui vive um povo que merece mais respeito...

Aqui vive um povo que cultiva a qualidade

De ser mais sábio que quem o quer governar.

A esperança é a última que se perde.

Bibliografia:ARNS, Paulo Evaristo (org.). Brasil Nunca Mais. 32.ª ed. Petrópolis (RJ): Vozes, 2001.COTRIM, Gilberto. História do Brasil: Um Olhar Crítico. São Paulo: Saraiva, 1999.FUENTES, Carlos Fuentes. Los 68: Paris-Praga-México. México DF: R.H.M., 2005. (Em português: Em 68: Paris, Praga e México. Trad. Ebréia de Castro Alves, Rio de Janeiro: Rocco, 2008.)GARAVITO, César Rodríguez, e FRANCO, Diana Rodríguez. Juicio a la Exclusión: El impacto de los tribunales sobre los derechos sociales en el Sur Global. Trad.: Carlos Morales de Setién Ravina. Siglo Veintiuno Ed., 2015, 259 pp. Em inglês no original, Radical Deprivation on Trial: The Impact of Judicial Activism on Socioeconomic Rights in the Global South (Cambridge University Press). Utilizei a versão ao espanhol Juicio a la Exclusion, disponível em <www.dejusticia.org/wp-content/uploads/2017/04>. Última consulta: 31.10.2022.NAPOLITANO, Marcos. 1964: História do Regime Militar Brasileiro. São Paulo: Contexto, 2014.

(*) JOSUÉ MARCILIO é jornalista, poeta, funcionário do TJMT e mestre em estudos literários.

Os artigos assinados são de responsabilidade dos autores e não refletem necessariamente a opinião do site de notícias www.hnt.com.br

 

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Carlos Nunes 11/11/2022

Pois é, e o Socialismo/COMUNISTA o que é? Pra saber, só morando em Cuba, China, Coreia do Norte, etc. Por lá não há Liberdade de Opinião e de Expressão, nem Partidos Políticos opositores, nem Direitos humanos, nem Imprensa Livre....Vai lá reclamar que o salário é uma miséria...vai reivindicar RGA, etc. Ninguém reclama de nada. Aceitam quietos NA MARRA as decisões do Governo Central. O cidadão virou fantoche do Governo. A União soviética implodiu...o infame muro de Berlim caiu. Aqui nas Américas do Sul e Central apareceram aprendizes de ditadores Socialistas/COMUNISTAs. Só faltava o Brasil...agora não falta mais. A famigerada CENSURA apareceu...É assim que começa, impedindo a Liberdade de Opinião e de Expressão, e a Liberdade de Imprensa. Já vi esse filme...

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