Um incêndio que destruiu o principal alojamento de uma usina de etanol em Porto Alegre do Norte (a 1.159 km de Cuiabá) revelou um grave cenário de violações trabalhistas, levando auditores fiscais do trabalho a descobrirem mais de 500 operários em condições análogas à escravidão. A operação, iniciada no dia 28 de julho, segue em andamento e é considerada uma das maiores já realizadas na região. As chamas, provocadas por trabalhadores revoltados com a falta constante de energia elétrica e água potável, expuseram o ambiente precário em que viviam: quartos de 12m² sem ventilação ou climatização, abrigando até quatro pessoas.
A situação tornou-se insustentável diante do calor intenso da região, impossibilitando o descanso dos operários. Após o incêndio, muitos trabalhadores foram realocados para casas, hotéis e até um ginásio de esportes nos municípios de Porto Alegre do Norte e Confresa, a cerca de 30 km da usina.
No entanto, as condições continuaram degradantes, com operários dormindo em colchões no chão, sem roupas de cama ou locais adequados para guardar seus pertences, muitos dos quais perdidos no incêndio. Além disso, a fiscalização identificou que nem todos os feridos no incêndio receberam Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT), prejudicando o acesso a benefícios e assistência médica. As investigações revelaram também práticas graves de aliciamento e servidão por dívida, com indícios de tráfico de pessoas.
Sem conseguir contratar mão de obra local, a empresa recorreu a recrutamentos em estados do Norte e Nordeste, como Maranhão, Piauí e Pará, utilizando anúncios em carros de som e mensagens via WhatsApp, com promessas falsas de altos salários e pagamento de horas extras.
Muitos trabalhadores relataram que precisaram pagar pela vaga a atravessadores ou custear passagens e alimentação até o canteiro de obras. Em casos em que a empresa arcou com os custos, os valores foram posteriormente descontados integralmente dos salários, o que é ilegal. Outro ponto grave foi o uso do chamado “ponto 2”, um controle paralelo de jornada onde horas extras eram pagas por fora, em dinheiro vivo ou cheque, sem qualquer registro nos contracheques ou recolhimento de FGTS e INSS.
Os relatos apontam jornadas exaustivas, sem folgas sequer aos domingos, prática proibida pela legislação. Com base no artigo 149 e 149-A do Código Penal Brasileiro e na Instrução Normativa 02/2021 do Ministério do Trabalho, os auditores formalizaram a caracterização da condição análoga à de escravo.
Apesar da gravidade, a empresa responsável demonstrou disposição para colaborar, sinalizando interesse em firmar um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com o Ministério Público do Trabalho, com medidas de reparação e prevenção. Os trabalhadores resgatados terão direito ao seguro-desemprego especial, pagamento de todas as verbas trabalhistas, inclusive horas extras pagas por fora, além do ressarcimento dos valores indevidamente descontados pelas passagens.
Cada operário também receberá R$ 1 mil como compensação pelos pertences perdidos no incêndio. A empresa se comprometeu a garantir o retorno seguro aos locais de origem dos trabalhadores, custeando passagens e alimentação. A operação contou com apoio do Ministério Público do Trabalho (MPT), da Polícia Federal e do Projeto Ação Integrada (PAI), que dará suporte na qualificação e reinserção profissional dos trabalhadores, evitando que voltem a ser vítimas de exploração.
Casos como esse podem ser denunciados anonimamente pelo Disque 100.
Clique aqui e faça parte no nosso grupo para receber as últimas do HiperNoticias.
Clique aqui e faça parte do nosso grupo no Telegram.
Siga-nos no TWITTER ; INSTAGRAM e FACEBOOK e acompanhe as notícias em primeira mão.