A recente decisão da Suprema Corte inglesa, que responsabilizou a mineradora anglo-australiana BHP pelo rompimento da barragem de Fundão, em Mariana (MG), marca um dos capítulos mais relevantes da história jurídica e socioambiental brasileira. Tratou-se de um julgamento emblemático não apenas pela dimensão do desastre que, relembre-se, causou dezenas de mortes, deixou centenas de famílias desabrigadas e comprometeu mais de 50 municípios nos Estados de Minas Gerais e Espírito Santo. Foi também paradigmático pelo caminho que as vítimas necessitaram percorrer para ver juridicamente reconhecido o seu direito à reparação.
A tragédia de Mariana permanece como o maior desastre socioambiental do Brasil. Passados quase dez anos, inúmeras vítimas ainda aguardam indenizações integrais, e muitos municípios seguem enfrentando a demora da Justiça brasileira em dar uma resposta efetiva. Foi justamente essa morosidade que levou municípios e vítimas a buscar a jurisdição britânica, aonde uma das proprietárias da Samarco, a BHP, poderia ser responsabilizada em seu próprio foro.
A posição vencedora no processo foi claríssima: não há qualquer impedimento constitucional para que municípios brasileiros busquem reparação em tribunais estrangeiros. Ademais, a Justiça inglesa julgou o caso aplicando direito brasileiro, algo que muitos ainda desconhecem ou interpretam de forma equivocada. Não houve “importação” de normas estrangeiras para julgar a BHP; ao contrário, o tribunal inglês aplicou o direito do local do dano, isto é, o direito do nosso país, conforme exige a própria lógica do direito internacional privado.
O que ficou demonstrado, à luz do nosso ordenamento jurídico, foi que a BHP não exerceu a devida diligência na operação da barragem. Houve avisos técnicos, alertas de risco e conhecimento prévio da instabilidade da estrutura. A empresa, mesmo assim, assumiu conscientemente os riscos, permitindo a continuidade da operação até que o rompimento produzisse a devastação que conhecemos. Por isso, o tribunal estabeleceu a responsabilidade direta e objetiva da mineradora pelos danos socioambientais — exatamente como prevê a regra do direito brasileiro.
A decisão foi, portanto, uma vitória significativa para os municípios, para os milhares de vítimas que, por quase uma década, enfrentam as consequências dessa tragédia e também para o direito brasileiro, que, ao contrário do que afirmaram alguns observadores, sai completamente fortalecido, mostrando-se um notável exemplo ao mundo de como tratar crimes socioambientais cometidos por corporações multinacionais.
(*) VALÉRIO DE OLIVEIRA MAZZUOLI é Professor Titular da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Mato Grosso – UFMT.
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