Esta semana aconteceu uma live com alguns dos professores da formação Black Belt, uma iniciativa dos colegas Darlan Campos, Guto Araújo e Marcello Natale. No desenrolar da conversa, um assunto veio à baila: a formação do profissional de marketing político no Brasil.
Em primeiro lugar, vale a pena lembrar alguns momentos e episódios que fizeram parte da curta história da atividade no país, relacionados à formação profissional do nosso mercado.
O professor Carlos Manhanelli, que criou junto com outros profissionais e presidiu a Associação Brasileira dos Consultores Políticos (ABCOP), realizou diversas edições do Congresso Brasileiro de Marketing Político e Estratégias Eleitorais. Vários colegas faziam palestras e especialistas internacionais também eram convidados. Manhanelli realizava com frequência as suas “Imersões Totais”, que levaram informação qualificada para mais de 2.000 pessoas.
Fui membro da ABCOP e diretor da entidade por muitos anos. Também fiz palestras nos congressos e realizei, em Minas, algumas imersões junto com o presidente da ABCOP, que, infelizmente, veio a falecer na pandemia de Covid-19.
Manhanelli sempre buscou conectar a ABCOP com entidades internacionais de marketing e comunicação política, como a Associação Internacional de Consultores Políticos (fundada por Joe Napolitan e Michel Bongrand) e a ALACOP (Associação Latino-Americana de Consultores Políticos).
Em Minas Gerais, também, promovemos eventos de marketing político e criamos algumas formações. Minha empresa realizou cinco seminários nacionais de marketing político na cidade de Belo Horizonte, levando para a capital mineira consultores como Chico Santa Rita, Gaudêncio Torquato, Rubens Figueiredo, Sérgio Arapuá de Andrade, além do próprio Manhanelli, que esteve presente algumas vezes.
Ainda na década de noventa, criei um curso de extensão em marketing político na PUC Minas e realizamos diversos eventos de marketing político na Escola do Legislativo da Assembleia de Minas. Da mesma forma, o professor João Henrique Faria coordenou cursos de pós-graduação, também em Minas Gerais, nos quais tive a honra de ministrar algumas disciplinas.
Brasil afora, também, eram realizadas diversas iniciativas como estas.
Contudo, só mais adiante, nos anos 2000, algumas universidades começaram a oferecer cursos regulares de pós-graduação em marketing político. A Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) criou o curso denominado Marketing Político, Opinião Pública e Comportamento Eleitoral, coordenado pelos professores Helcimara Telles e Antônio Lavareda. Fui professor desse curso por quatro anos. A USP oferece um curso semelhante que funciona até hoje. A Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM) também oferta um curso chamado Comunicação Política e Marketing Eleitoral. Hoje existem muitas universidades que oferecem cursos relacionados ao marketing político, às campanhas eleitorais e à comunicação política.
Na eleição de 2014, o marketing digital começou a ganhar força, mas foi em 2018 que realmente despontou como uma área fundamental para a comunicação política e as campanhas eleitorais. A partir daí, o mercado de marketing político passou a sofrer grandes transformações. Surgiu, então, uma distinção entre os consultores “tradicionais” — mais ligados à TV e ao rádio, em geral com trajetória acadêmica e experiência em campanhas majoritárias — e os novos quadros vindos do universo digital, mais ágeis e orientados por métricas de redes sociais.
O mercado se abriu. Uma grande quantidade de profissionais, em geral mais jovens e oriundos do digital, vem entrando com toda força no mercado de comunicação política. De 2018 para cá, é impressionante o crescimento do número de pessoas que passa a atuar com cada vez mais protagonismo — afinal, não há uma prefeitura, por menor que seja, ou um gabinete de vereador, deputado ou senador que não conte com um profissional de comunicação que domine as ferramentas do marketing digital.
São profissionais forjados no dia a dia, na prática dos governos e gabinetes e das campanhas. Cada um foi buscar formação em uma das ilhas disponíveis, seja na academia, nos cursos e palestras, nas mentorias, nos livros etc.
Em 2018, surgiu o Clube Associativo dos Profissionais de Marketing Político (CAMP), presidido por Bruno Hoffmann. O CAMP passou a ser um importante espaço de encontro, debate, representação da categoria e, também, de produção de conhecimento. O Prêmio CAMP da Democracia é um evento que celebra o mercado e reconhece diversos profissionais Brasil afora.
Na minha percepção, o CAMP conseguiu fazer algo até então impensável: promover uma aproximação e uma integração bem maior entre os profissionais mais atuantes no mercado. A antiga rivalidade e concorrência que existia, por exemplo, entre figuras como Chico Santa Rita e Duda Mendonça, vai aos poucos dando lugar a uma situação de coleguismo, de ajuda mútua e complementaridade — muito fruto da percepção de que o mercado é grande demais para o número de profissionais qualificados disponíveis e de que é melhor cooperar do que competir. Essa cooperação acontece muitas vezes entre profissionais mais sêniores e os mais jovens focados no digital.
Importante destacar também o surgimento do COMPOL, criado em 2023, como uma grande inovação. Esses eventos, criados e liderados pelo consultor Marcello Natale, reúnem milhares de pessoas em todo o Brasil e abrem espaço de palestras para centenas de profissionais, que passam a ter visibilidade, obter validação e subir em palcos extremamente qualificados.
Contudo, fica uma pergunta: onde esses profissionais que atuam na comunicação política vão adquirir uma formação especializada?
Os cursos de pós-graduação existentes hoje, geralmente, estão um pouco distantes da realidade das campanhas eleitorais, governos e mandatos. É preciso repensar formatos para fazer a necessária e muito bem-vinda conexão entre teoria e prática. As ofertas de cursos em outros países, como na vizinha Argentina (Universidad Católica de Buenos Aires), na Espanha (Universidad de Salamanca, Universidad Complutense de Madrid) ou nos Estados Unidos (George Washington University, Harvard Kennedy School), acabam sendo mais efetivas na oferta de um aprendizado mais conectado com a realidade de campanhas, partidos e governos.
Por outro lado, alguns profissionais atuantes no mercado vêm oferecendo cursos e formações que qualificam centenas de profissionais, como Emerson Saraiva (Eleja-se), Lucas Pimenta (Escola dos Políticos) e Marcello Vitorino. Formações como a Black Belt são uma novidade nessa área, buscando oferecer qualificação mais densa para profissionais que já tenham alguma experiência no mercado.
Outro espaço para qualificação é o circuito de eventos de marketing político e comunicação política já bastante consolidado no Brasil, como o próprio Compol Brasil e os Compol’s regionais, que se somam a eventos como Reboot, Marketing 360, Politicall e o Comunique.
Entretanto, existe espaço para formações (em modelo de pós-graduação, extensão ou cursos com carga horária maior) que ofereçam aos profissionais que já atuam no mercado — ou que desejem nele ingressar — uma preparação que alie teoria, técnica/ferramental, metodologia e prática.
Esse futuro passa também pela incorporação de novas competências, como o domínio e análise de dados e inteligência artificial aplicada a campanhas - microtargeting, análise de big data, uso de IA generativa, neurociência, metrificação de performance, gestão de crises digitais, combate à desinformação (fake news, deepfakes), além de habilidades de trabalho omnichannel, storytelling e media training.
É preciso estudar quais as melhores modelagens possíveis, mas que há demanda e mercado para tal empreitada, não resta dúvida. Mais do que criar cursos, trata-se de construir um modelo mais híbrido, um verdadeiro ecossistema de formação continuada — uma ponte que una academia, mercado e instituições políticas, preparando os profissionais brasileiros para competir em um cenário cada vez mais complexo e digital, que abre possibilidades de trabalho não só no Brasil, mas em toda a América Latina, Europa e África. Está lançado o desafio!
(*) RODRIGO MENDES é Publicitário, sociólogo e cientista político, especialista em marketing e mestre em Ciência Política pela UFMG. Foi professor da pós-graduação em Marketing Político – UFMG, assessor de marketing da Prefeitura de Belo Horizonte e secretário de Comunicação do Mato Grosso do Sul. Consultor dos governos de Alagoas e Sergipe e das Assembleias Legislativas de MG e PB. Atuou como consultor do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de 2004 a 2010, sendo responsável pela campanha Vota Brasil. Participou de mais de 62 campanhas eleitorais em todo o Brasil. Autor dos livros Marketing Político: O Poder da Estratégia nas Campanhas Eleitorais e coautor de Marketing Eleitoral: Aprendendo com Campanhas Municipais Vitoriosas, além do e-book Novas Estratégias Eleitorais para um Novo Ambiente Político.
Os artigos assinados são de responsabilidade dos autores e não refletem necessariamente a opinião do site de notícias www.hnt.com.br
Clique aqui e faça parte no nosso grupo para receber as últimas do HiperNoticias.
Clique aqui e faça parte do nosso grupo no Telegram.
Siga-nos no TWITTER ; INSTAGRAM e FACEBOOK e acompanhe as notícias em primeira mão.