O grande Eduardo Galeano, em sua memorável e imprescindível obra As Veias Abertas da América Latina, escancara, de forma vigorosa, como as riquezas do nosso continente foram - e continuam sendo - drenadas pelas chamadas grandes potências. Antes, as coloniais; hoje, as imperialistas. Ele demonstra com precisão poética e rigor teórico que nossas riquezas naturais serviram, por meio de sucessivos saques, para enriquecer Europa e Estados Unidos, enquanto nossos povos foram condenados à pobreza e à exploração.
Com lirismo e contundência, Galeano revela que a origem da desigualdade latino-americana está profundamente enraizada no processo de espoliação colonial. Pau-brasil, ouro, prata, cobre, açúcar, cacau, café, borracha, petróleo - as veias abertas de um continente sangrado para sustentar o luxo alheio. Como definiu o próprio autor: “A divisão internacional do trabalho consiste em que uns países se especializam em ganhar e outros em perder.”
O fim do colonialismo não trouxe libertação, apenas a troca de senhores. O domínio europeu deu lugar à influência norte-americana. Empresas estrangeiras passaram a controlar o petróleo, a mineração e a agricultura. Para consolidar esse poder, fomentaram golpes de Estado e ditaduras militares. Substituíram os canhões e espadas por um novo instrumento de dominação: a dívida externa - agora, bancos e corporações multinacionais ditam o destino das nações.
Nesse enredo de dependência, as elites latino-americanas cumprem um papel vergonhoso. Tornam-se propagandistas da submissão e sócias menores dos exploradores. Não é síndrome de Estocolmo - é canalhice. Uma aliança consciente para manter intactos os próprios privilégios. Assim, governos e elites econômicas, políticas e intelectuais colaboram com o capital estrangeiro, perpetuando um modelo em que poucos concentram a riqueza e a maioria sobrevive na miséria.
A recente cena de Javier Milei - roqueiro frustrado e dublê de presidente - ajoelhado diante de Donald Trump em busca de socorro financeiro é a tradução perfeita dessa elite subserviente. Após o desastre de Mauricio Macri, que endividou a Argentina junto ao FMI e aprofundou sua dependência, Milei repete o script: busca novos operações financeiras apenas para pagar juros de uma dívida que não aliviou em nada o sofrimento da população, em um país onde cerca de 40% vivem na pobreza.
E o mais simbólico nesse encontro entre Trump e Milei - que, frustrando o delírio do lunático vira-lata, não ocorreu no Salão Oval - foi a chantagem explícita do presidente norte-americano: a ajuda só viria se os candidatos apoiados por Milei nas eleições parlamentares fossem vitoriosos. Em outras palavras, ou o povo argentino vota nos que aprofundam sua miséria e submissão, ou não haverá “ajuda”.
Uma interferência estrangeira escancarada no processo democrático argentino. Mas, conhecendo os hermanos, é provável que o tiro saia pela culatra. A derrota já iniciada na província de Buenos Aires tende a se espraiar por todo o país - e talvez, enfim, o povo argentino impeça que suas veias continuem sendo abertas em nome da dependência e da vergonha.
(*) OLIVEIROS MARQUES é sociólogo, publicitário e comunicador político.
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