Quando a gente começa a fazer essas pesquisas sobre a saúde mental em mulheres e as psicopatologias como todo, fica explícito que elas estão mais suscetíveis do que os homens a desenvolver qualquer tipo de doença.
Minha primeira reação diante dos números foi pensar, será que voltamos àquele lugar do início do século 20, em que a “histeria” esteve presente em enciclopédias, manuais de puericultura e obstetrícia como representações do feminino e das doenças “de mulheres”?
Confesso que isso me indignou inicialmente. Mas persisti nas reflexões até que me deparei com a pesquisa da ONG Think Olga (2023) que apontava que no contexto pós-pandemia, 45% das mulheres brasileiras obtiveram diagnóstico de ansiedade, depressão ou algum outro transtorno mental.
Foram ouvidas 1.078 mulheres, entre 18 e 65 anos. A conclusão é meio óbvia, mas precisamos falar sobre o óbvio: elas estavam completamente esgotadas, físico e mentalmente, por desempenharem múltiplas tarefas, além de não terem segurança financeira adequada e tempo de descanso.
O adoecimento psíquico das mulheres aponta para um cenário social disfuncional em que elas ingressaram no mercado de trabalho, mas continuaram responsáveis pelos cuidados com a casa, os filhos e os idosos, além disso, quase sempre recebem salários menores justamente por acumularem as outras funções ligadas à família.
Aqui chegamos a um ponto crucial para compreender esse desequilíbrio, que são as crenças que depositam nos ombros da mulher o papel de “cuidar dos outros”. Meninas ainda são socializadas a desenvolver mais habilidades cuidadoras (brincar de boneca e casinha), enquanto meninos estimulados a brincadeiras de sobrevivência e jogos.
É importante destacar que a educação exerce forte impacto na saúde mental de homens e mulheres. Como são criados para desenvolver forte senso de independência, coragem e autoestima, os homens naturalmente se cuidam e priorizam mais, enquanto mulheres têm dificuldade para cuidar de si mesmas.
Costumo usar a metáfora do momento em que estamos no avião e o comissário de bordo explica o que fazer se houver um problema: “Em caso de despressurização, máscaras cairão automaticamente. Coloque a máscara de oxigênio primeiro em você. Só depois auxilie os outros, caso necessário”.
Fui pesquisar o porquê primeiro em mim e só depois na outra pessoa. Descobri que durante a despressurização da cabine, costuma faltar oxigênio. Se você tentar colocar a máscara primeiro em outra pessoa, poderá desmaiar por falta de oxigênio e ambos morrerem. Portanto, a orientação é simples: coloque a máscara primeiro em si mesmo.
Acontece que no dia a dia as mulheres não têm conseguido colocar a máscara primeiro em si mesmas, elas priorizam as necessidades dos filhos, do marido, dos pais, do trabalho... e não podemos responsabilizá-las, pois internalizaram, desde muito pequenas, que precisam “cuidar” das outras pessoas.
No processo psicoterapêutico, a gente passa a olhar para todas essas crenças, com o objetivo de ressignificar, dando espaço para a construção do amor próprio das pacientes. Não é sobre deixar de amar ou cuidar do outro, mas sobre ter uma relação amorosa e gentil consigo mesma, o que vai permitir equilibrar melhor as atividades e resgatar a saúde.
Durante o mês da mulher, é importante debater pautas prioritárias, entre elas, os cuidados com a saúde mental das mulheres, já elas desempenham papéis fundamentais na família e na comunidade. Além disso, mulheres saudáveis são mais produtivas, felizes e contribuem para o desenvolvimento cultural, social e econômico do país!
(*) CRISTIANE AMARAL é psicóloga com formação em transtorno de ansiedade e depressão no Instituto Albert Einstein.
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