Cuiabá é uma das cidades brasileiras em que é lembrado, neste domingo (12), o Dia de Conscientização da Cardiopatia Congênita, bandeira levantada pela Associação de Assistência à Criança Cardiopata Pequenos Corações, com sede em São Paulo, mas com atuação em todo território nacional.
Em Cuiabá e Várzea Grande, a entidade conta com duas coordenadoras, Durcila Cordeiro e Mírian Botter.
Mães de crianças que nasceram com defeito congênito do coração abraçaram a causa não só por causa dos seus filhos, mas pelos filhos de outras mães que nasceram ou ainda vão nascer com algum problema de coração.
Dados conferem que de cada 100 crianças, uma pelo menos nasce com cardiopatia.
O assunto ainda é pouco falado no Brasil e muitos ainda nascem e não chegam ao tratamento por falta do diagnóstico. A Associação de Assistência da Criança Cardíaca (AACC) quer justamente levar ao conhecimento de todos que há um problema e fazer com que mais crianças possam ter uma chance de vida.
Para isso tem cada vez mais buscado o apoio não só das famílias, mas de instituições sérias comprometidas com a causa, como hospitais, profissionais médicos, poder público e a sociedade civil organizada. Vários já vêm apoiando a AACC, a exemplo do Hospital do Coração em São Paulo que já é um parceiro.
Segue entrevista que a jornalista Durcila Cordeiro fez com a médica cardiopediatra Maria Cecilia Knoll Farah, de Cuiabá.
Como você vê a atual situação dos cardiopatas congênitos em nosso país e em especial em Mato Grosso?
Maria Cecília - Posso dizer que desde que as primeiras cirurgias para correção das cardiopatias congênitas ocorreram, na década de 50, o desenvolvimento cientifico e tecnológico avançou extraordinariamente graças à dedicação, empenho e investimento de muitos centros de excelência médica mundial. Dentre eles, o Professor Jesus Eurípides Zerbini no Instituto do Coração - USP foi o pioneiro no Brasil. Nesse mesmo período houve também grande avanço nos conhecimentos e técnicas de terapia intensiva pediátrica e neonatal o que sem dúvida foi importante fator de sucesso das cirurgias cardíacas pediátricas. Hoje existem muitos serviços de Cirurgia Cardíaca Pediátrica, não só nas grandes metrópoles, mas também no interior da maioria dos estados do sul-sudeste do Brasil, que estão aptos a realizar todos os tipos de cirurgia cardíaca pediátrica com excelente índice de sucesso atendendo não só os pacientes locais, mas também os pacientes oriundos de estados e cidades que não possuem todo tipo de tratamento para essas cardiopatias, como é o caso de Mato Grosso.
Cuiabá já consegue atender a grande maioria dos seus casos com cirurgias? O que falta para isso? Poderia “desenhar um quadro” da situação local e o que poderia ser feito para melhor atender essas crianças?
Cecília - Primeiro é preciso esclarecer que existem diferentes tipos de cirurgias cardíacas pediátricas com diferentes graus de complexidade. Há cirurgias para corrigir definitivamente o defeito cardíaco congênito. São cirurgias de grande porte, realizadas “dentro” do coração enquanto uma máquina mantém a circulação do sangue garantindo a sobrevivência do paciente. Em outras situações há necessidade de realizar-se um procedimento paliativo (não corretivo) que garanta a sobrevida do paciente postergando cirurgia cardíaca corretiva. É um procedimento mais simples, mas também muito delicado. Temos também que considerar a diversidade de pacientes. Por exemplo; existem pacientes que precisam de cirurgia logo após o nascimento quando pesam de 2 a 3 kg. Existem até prematuros com menos de um quilo nessa situação. Por outro lado existem crianças que conseguem conviver com sua cardiopatia por anos necessitando de cirurgia quando já tem idade e peso maiores. Em Cuiabá é realizada a maioria das cirurgias paliativas, mesmo em recém-nascidos muito pequenos, mas as cirurgias corretivas são realizadas apenas para crianças maiores. Resta, portanto, uma lacuna que engloba grande número de crianças que precisam ser transferidas para outros estados para receberem o tratamento adequado. O pior é que muitas vezes isto ocorre em situações críticas e urgentes obrigando a transferências em UTI aérea. Fazendo uma comparação com a cirurgia cardíaca pediátrica praticada atualmente nos centros de excelência do Brasil e do mundo posso afirmar que o Mato Grosso 40 anos atrasado.
Os hospitais estão preparados para atender os cardiopatas?
Cecília - Nos últimos 25-30 anos várias equipes de cirurgia cardíaca se esforçaram por implantar a cirurgia cardíaca pediátrica em Cuiabá. Atualmente a maioria das equipes opera adultos e jovens com mais de 30kilos. Apenas uma equipe realiza cirurgias em crianças graças à persistência e dedicação da equipe da Dra. Ana Helena Dotta, cirurgiã cardiovascular que realiza os procedimentos de cirurgia cardíaca paliativa no período neonatal e os procedimentos corretivos em crianças maiores. Trabalhando há aproximadamente 10 anos, muitos prematuros, inclusive os prematuros extremos que pesam menos de 1 quilo, recém nascidos cardiopatas e crianças maiores foram operados. O trabalho desta equipe poderia ser muito mais abrangente se tivesse recebido o apoio necessário das Secretarias de Saúde, já que a maioria das crianças cardiopatas necessita de atendimento pelo SUS. Em várias ocasiões o trabalho desta equipe foi lamentavelmente interrompido por muitos meses em decorrência da interrupção de contrato ou do pagamento dos procedimentos já realizados pelo SUS.
Existe ainda muita burocracia ou dificuldade quando se precisa mandar uma criança para o tratamento fora do domicílio?
Cecília - A maior dificuldade é conseguir a vaga para os pacientes de MT nos serviços de cirurgia de outros estados. O agendamento da consulta ou transferência é feito por uma central nacional de regulação de procedimentos de alta complexidade (CNRAC), na qual nossos pacientes são inseridos via internet. Muitas vezes são meses de espera. Os casos que necessitam da transferência em caráter de urgência são ainda mais complicados, pois existe uma lacuna entre a CNRAC, que não tem um fluxograma diferenciado para casos urgentes e central de urgência e emergência do estado, pois esta faz a regulação apenas dentro do estado de MT.
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