A arte mato-grossense ainda vive um luto com a perda do artista plástico Adir Sodré, que morreu na última segunda-feira (10), aos 58 anos. Ele teria sofrido um infarto em frente a sua residência em Cuiabá. Nascido em Rondonópolis (a 220 km de Cuiabá), mas criado na Capital, os trabalhos de Sodré permanecerão vivos em diversos pontos da cidade, como em muros, viadutos, nas paredes do tradicional restaurante Choppão e em diversas galerias do Brasil e do mundo.
Para o ex-secretário municipal de Cultura e compadre do artista, Mário Olímpio, é muito difícil encontrar um rótulo para definir as pinturas de Sodré, que começou trabalhando desde os 10 anos pintando fachadas de lojas. Ele conta que Sodré era o caçula entre seis irmãos e que precisava se destacar de alguma forma.
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"Ele nunca foi um bom aluno na escola, nunca foi aplicado, ele precisava chamar atenção de alguma forma e foi quando começou a desenhar. Sodré tinha como inspiração gibis da época, ele copiava figuras, era chamado para desenhar no quadro negro da escola, isso desde os 5 a 8 anos, mas foi a partir dos 10 anos que ele passou a trabalhar pintando fachadas de comércio local", relembrou em entrevista à Rádio Nativa FM.
Olímpio relembra que Sodré iniciou sua vida artística em 1977 no Ateliê Livre da Fundação Cultural de Mato Grosso, onde foi orientado por Humberto Espíndola e Dalva de Barros.
Nos dois anos seguintes integrou, com Gervane de Paula e outros artistas, um grupo que procurou renovar a arte regional. Nessa época, participou de exposições coletivas organizadas pelo Museu de Arte e de Cultura Popular da Universidade Federal do Mato Grosso (MACPP/UFMT).
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"Ele foi ao longo dos anos um filósofo, não se esgotava no quadro de artista plástico, ele escrevia, cantava, ele pensava muito. Enxergava muito mais do que a gente. Adir foi no educando para artes plásticas. Eu nada sabia até que ele foi me mostrando", ressalta.
O ex-secretário conta que as pinturas de Sodré são um registro da vida cotidiana nos bairros populares de Cuiabá e também da paisagem regional. Para Mário Olímpio é difícil achar rótulo para definir o trabalho do artista plástico. "Adir era um artista popular. Ele começa em 1977 pintando o cotidiano do bairro dele, pintando bares, ruas, comícios, festas de santos. Quando ele conhece o movimento de arte política, ele começa a caminhar para crítica política muito poderosa no período da ditadura militar. Ele fez uma crítica muito pesada contra os militares, contra a pobreza e desigualdade social".
"Passado esse momento, Adir descobre alguns traços diferentes e começa a fazer de forma rápida, mudança de traço, muito colorido e descobre nas flores, nas mangas, nos cajus, nos peixes, nos santos, ele era um artista que ia e vinha com suas facilidades muito grandes. Em fases muito bem definidas", aponta.
O trabalho de Sodré também é marcador por desenhos eróticos em jardins. Adir pintava pênis e vaginas em flores. "Adir tinha muito para produzir ainda. E essa coisa erótica dele a gente sempre soube que era brincadeira, ele fazia gozação com isso. Sodré dizia que defunto não tem orgasmo. Ele brincava com uma coisa do Vincent van Gogh que vendeu um quadro em vida e depois de morte vira milionário. Fica um imenso sentimento de gratidão. Ele viverá para sempre na nossa memória".
Amigos lamentam morte
Para a crítica de arte Aline Figueiredo, Sodré sempre foi muito corajoso ao transmitir o que pensava em suas artes. Ele sempre foi muito contemporâneo e único. “O conheço desde os primeiros traços, sempre foi muito batalhador, ousado, performático. O próprio nome Adir diz muito que é adição, soma, um dos artistas que queria descentralizar o circuito da arte brasileira, até então ficava apenas em um nicho. Tivemos a oportunidade de criar o Ateliê Livre, no Palácio da Instrução, mas que infelizmente não existe mais”, ressalta.
O artista plástico Valques Pimenta relembra que conheceu Sodré ainda em1988 e desde então sempre manteve contato com o amigo de profissão. “É uma perda muito grande para nossa classe de artistas. Ele sempre foi uma inspiração desde a época, irreverente e ousado. Perdemos muitos amigos nesses últimos anos como João Sebastião, Nelson Pimenta, Benedito Nunes e agora Sodré, todos com sua peculiaridade, identidade visual”, disse.
Escritor e advogado Eduardo Mahon disse que Adir tinha uma dimensão nacional e internacional do trabalho. Ele conta que o artista promoveu uma outra mirada no cotidiano da Capital e revelou uma identidade que não era clichê. “Uma mirada periférica e não de uma arte convencional. Uma mirada popular, uma visão urbana, cotidiana e, claro, com uma tonalidade sexual muito diferente do que se fazia em Cuiabá nas décadas anteriores onde os temas que ele, Gervane de Paula, Dalva, tocavam eram absolutamente tabus”, disse.
“Então, revelou uma identidade que não era uma identidade clichê. Era uma identidade criada pelo talento dele que extravasou Mato Grosso. Eu já vi Adir Sodré em uma amostra do acervo permanente do Masp, ou seja, um museu internacional. Ele expôs em Paris, na França, além de ser absolutamente consagrado aqui em Mato Grosso”, finalizou.
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