Considerando que estamos ainda em uma sociedade estruturada pela violência de gênero do homem contra a mulher no âmbito doméstico e familiar, temos, nesse tipo de violência, o corriqueiro, cujo enfrentamento tornou-se pauta para muitas e muitos, em razão da patente fragilidade dessas mulheres, que, imersas em ciclos de abuso, vão se despersonalizando e, quando se percebem, carecem de amparo, apoio, proteção, o que, muito mais do que boa vontade, mãos pintadas e discursos inflamados de homens e mulheres, demanda representatividade com pautas femininas e políticas públicas – para mulheres.
A sobreposição do masculino sobre o feminino é reconhecida pelas Cortes Internacionais. Enquanto Nação, o Brasil é signatário de tratados que o vinculam à erradicação e combate de todas as formas de violência de gênero contra a mulher. Ocorre que só se erradica, só se combate, aquilo que se vê.
Ocupar espaços políticos e de representatividade, questionar privilégios decorrentes de classe, raça, etnia, e principalmente, de gênero, demanda de um homem força, coragem e uma boa dose de fé. De uma mulher, demanda muitas das vezes a própria existência, um esforço sobre-humano para manter-se e se fazer ouvida, no local que lhe é seu, por direito conquistado.
Violência política contra a mulher é um conjunto de atos sistematicamente articulados com a finalidade de excluir ou restringir a mulher que defende pautas femininas do espaço político e de representatividade, e/ou induzi-la a tomar decisões contrárias à sua vontade ou à do seu grupo.
Ações violentas muito comumente direcionadas a mulheres que estão na disputa do poder político, durante a campanha, ao longo do mandato e após ele, é violência política, que é crime, vale dizer.
Quantas de nós, mulheres, para nos vermos aclamadas pela sociedade- machista- e nos sentirmos pertencentes, lançamos ao vento falas que invalidam os nossos direitos, as nossas conquistas, totalmente “marionetizadas” nesse universo que se ocupa mais em questionar a feminilidade das que se opõe ao sistema, do que propriamente à sua aptidão e competência para o exercício do seu cargo?
Somos mesmo iguais?
Se somos feias, não servimos porque a feiura nos fez amargas, se bonitas, burras. Se solteiras, vadias histéricas, se casadas, apagadas, submissas às vontades dos maridos.
Como subtipos da violência política temos a simbólica (no plenário do Senado Federal não havia banheiro feminino até o ano de 2.016); a psicológica (interrupção frequente da fala da mulher, dispersão dos interlocutores durante a sua fala, sinalização de descrédito ante as suas ideias, desqualificação por meio de atribuição de estereótipos femininos: histérica, nervosa, louca, vadia- , difamação, intimidação por meio de vozes e gestos alterados e carregadas de agressividade e ameaças); econômica (desproporção nos recursos de fundo partidário); sexual (comentários e propagação de imagens sensualizadas da mulher- coisificação do corpo feminino-, assédio sexual); física (empurrão, objetos lançados), dentre outras práticas.
Bertha Lutz é conhecida como a maior líder na luta pelos direitos políticos das mulheres brasileiras. Ela se empenhou pela aprovação da legislação que outorgou o direito às mulheres de votar e de serem votadas. A primeira mulher brasileira a ocupar a tribuna do Parlamento foi Carlota Pereira Queirós, a única deputada federal eleita dentre 253 integrantes da Casa à época.
Próximas inicialmente, Bertha e Carlota se afastaram gradativamente por visões divergentes sobre como deveriam pautar seus mandatos. Embora trouxesse em sua fala a alegria pelo avanço da sociedade, refletido na sua presença como figura feminina num espaço predominantemente masculino, era evidente o distanciamento de Carlota da luta das mulheres ao encampar um discurso mais regionalista, em defesa dos interesses do Estado de São Paulo, em vez de se assumir como representante da população feminina.
A paridade de gênero na representação política garante, para além da diversidade almejada pelo próprio constituinte, a garantia de uma agenda de debates mais ampla e que coloque voz em grupos historicamente silenciados. A questão é: o simples fato de ser mulher me torna empática e comprometida às demandas femininas, de outras mulheres?
Em se tratando de Direitos da Mulher, não há conquista mais relevante que a do voto feminino, que nos garantiu acesso, inclusive, aos espaços de representatividade.
No entanto, não podemos deixar de voltar as nossas atenções à ocorrência do chamado tokenismo, que, de forma simplista e estreita, pode ser conceituado como a prática em mascarar o machismo (ou o racismo) promovendo a inclusão do “token” – um pequeno grupo cuidadosamente escolhido para representar um todo excluído, sem força ou compromisso com as suas respectivas pautas e demandas, como forma de perpetuar as desigualdades raciais e de gênero, pela falsa representatividade nos espaços de decisão e poder - uma inclusão simbólica que consiste em fazer concessões superficiais a grupos minoritários, para se desviar de acusações de discriminação.
As práticas atuais atendem a necessidade de diversidade?
“Você tem que ver, cheirar e sentir as circunstâncias das pessoas para realmente entende-las”. – Kamala Harris.
(*) BÁRBARA LENZA LANA é advogada para Mulheres, Líder do Comitê de Combate à Violência Contra a Mulher do Grupo Mulheres do Brasil- Núcleo Cuiabá. E-mail: lenzalana@hotmail.com
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