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Artigos Terça-feira, 23 de Dezembro de 2025, 14:09 - A | A

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Terça-feira, 23 de Dezembro de 2025, 14h:09 - A | A

FÁBIO MONTEIRO

Havaianas: da campanha à crise

FÁBIO MONTEIRO

A polêmica em torno do novo comercial das sandálias Havaianas recoloca no centro do debate um tema que vem se tornando recorrente e cada vez mais sensível na comunicação corporativa: o risco de campanhas publicitárias se tornarem gatilhos de crises de imagem em um ambiente social marcado por tensões, leituras apressadas e alta carga simbólica, capazes de gerar manchas duradouras na reputação e enquadramentos políticos que nem sempre são reais, intencionais ou coerentes com a trajetória das marcas.

Hoje, nenhuma campanha nasce em terreno neutro. Não apenas por escolhas criativas, mas porque toda mensagem lançada ao público passa a circular em um ambiente social profundamente polarizado, no qual símbolos, falas e narrativas são rapidamente apropriados por disputas ideológicas que extrapolam o controle de quem comunica. Nesse contexto, marcas podem ser empurradas para campos políticos que nunca decidiram ocupar e não por estratégia, mas por interpretação.

O equívoco mais comum é tratar esse tipo de situação como um simples “mal-entendido”. Isso já não neutraliza críticas, porque o que está em jogo não é apenas a mensagem em si, mas o choque entre a intenção – construída no contexto interno da criação da campanha – e a percepção, formada publicamente em uma sociedade que, nos últimos anos, perdeu espaço para leituras mais equilibradas e menos reativas.

É nesse ambiente que o risco reputacional se amplia. Ao ser associada a determinada pauta política ou ideológica, muitas vezes por uma interpretação pueril do discurso publicitário, a marca passa a carregar rótulos difíceis de remover. Esses enquadramentos tendem a ser rápidos, simplificados e, não raro, injustos, mas encontram terreno fértil para propagação.

O ambiente digital intensifica esse processo. Redes sociais não operam na lógica da ponderação, mas do engajamento emocional. Quanto mais polarizada a leitura, maior o alcance. Assim, campanhas concebidas para reforçar atributos e autoridade das marcas acabam funcionando como gatilhos para disputas simbólicas, nas quais a empresa se torna personagem involuntária de debates políticos, sociais ou culturais que não controla.

Há ainda um componente cultural que ajuda a compreender a reação observada em uma sociedade atravessada por tensões acumuladas nos últimos anos. A campanha acabou tangenciando uma premissa profundamente enraizada no imaginário brasileiro: a ideia de “entrar o ano com o pé direito”. Superstições, goste-se ou não delas, persistem no imaginário social. Quando a comunicação de uma marca toca nesses símbolos, entra em um campo delicado, onde a racionalidade do briefing nem sempre dialoga com a emocionalidade coletiva.

Tentar ressignificar conceitos culturalmente consolidados pode ser percebido como inovação criativa. Mas, em um ambiente social já tensionado, também pode ser lido como desconexão simbólica. Não porque a sociedade seja refratária à mudança, mas porque, em determinados temas, a reação antecede a reflexão.

O impacto desse conjunto de fatores vai além do desgaste imediato. Crises dessa natureza deixam registros persistentes, influenciam a confiança do público e afetam relações institucionais. Mesmo quando a polêmica perde intensidade, o rastro permanece, seja nos mecanismos de busca, nas redes ou na memória coletiva.

Por isso, o desafio contemporâneo não está apenas em criar campanhas criativas, mas em compreender o ambiente social em que elas serão lançadas. Publicidade, hoje, exige leitura de contexto, sensibilidade cultural e análise de risco reputacional. É preciso perguntar como a mensagem pode ser apropriada ou distorcida em um cenário social cada vez menos tolerante a interpretações simplistas.

Importa sublinhar que esta reflexão não se confunde com a defesa da autocensura. Trata-se de maturidade estratégica em um tempo em que marcas são constantemente pressionadas a assumir posições, no qual o silêncio pode ser lido como omissão e a palavra, como militância.

O episódio recente deixa uma lição clara: campanhas publicitárias hoje não enfrentam apenas o julgamento do mercado, mas o tribunal da opinião pública moldado pelo espírito do tempo. Como já advertia Aristóteles, cada um é senhor do seu silêncio e escravo de suas palavras. Comunicar deixou de ser apenas emitir mensagens. Passou a ser, sobretudo, gerenciar riscos de interpretação.

(*) FÁBIO MONTEIRO é jornalista especialista em crise de imagem e CEO da Dialum Assessoria de Imprensa & Comunicação Estratégica

Os artigos assinados são de responsabilidade dos autores e não refletem necessariamente a opinião do site de notícias www.hnt.com.br

 

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