Plano fechado. Um big close, adequado aos padrões verticais das redes sociais. Olhar fixo na câmera, voz firme, texto pontuado. Pronto: a personagem está bem posicionada para fazer uma avaliação política que se pretende vender como neutra. Como se o que estivesse em jogo não fosse outra coisa.
Assisti a uma dessas performances que me chamou bastante a atenção. A comentarista afirmava que a ida do deputado federal Guilherme Boulos (PSOL/SP) para o ministério seria uma “sinalização do desgaste no núcleo da base de Lula”. Tal análise, se não carregasse consigo um objetivo estratégico, soaria pueril.
É fato que Lula e seu governo precisam se reconectar com uma parcela importante do eleitorado que historicamente compõe sua base social. Um eleitorado hoje captado pela “teoloria” da prosperidade, cooptado por seitas, sequestrado por fake news - e também há aqueles libertos da pobreza extrema que desenvolveram novos aspiracionais e precisam ser compreendidos em sua moral. Isso, as pesquisas já vêm identificando, e não é de hoje. Mas afirmar que isso representa uma crise no “núcleo da base de Lula” é um salto considerável. As próprias pesquisas eleitorais mostram o contrário: o atual presidente permanece competitivo em todos os cenários.
O que essas pretensas análises neutras - ainda que eivadas de interesses - não conseguem enxergar é o que está bem diante de seus narizes: Lula está organizando a direção do seu time para entrar em uma guerra, talvez até vencendo os adversários sem precisar lutar.
No milenar livro A Arte da Guerra, de Sun Tzu, há diversos trechos em que se enfatiza a importância de cuidar do próprio território, manter a ordem interna e organizar o exército antes de se lançar em um conflito externo. Embora não haja uma frase exata como “primeiro cuide do seu território e organize seu exército”, essa ideia está presente de forma recorrente, especialmente nos capítulos sobre planejamento, estratégia e tática.
Sun Tzu destaca que conhecer a si mesmo é essencial para se fortalecer diante do inimigo. Isso pode ser interpretado, objetivamente, como conhecer e cuidar do seu território, do seu povo e do seu exército — ou seja, estar preparado internamente.
É isso que, de fato, representa a ida de Boulos para a Secretaria-Geral da Presidência, cuja principal missão é articular a relação política do governo com os movimentos sociais organizados. Essa relação não está em crise - está, sim, desarticulada. E essa, ao que tudo indica, será a tarefa confiada a Boulos. Porque, como um general sábio, Lula está a cuidar do bem-estar de seus dirigentes e impedirá a desordem no campo.
(*) OLIVEIROS MARQUES é sociólogo, publicitário e comunicador político.
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