Vítimas de violência doméstica sofrem alterações cerebrais, que impactam na resposta ao medo e na tomada de decisões, explica a neurociência, área científica que estuda o sistema nervoso, incluindo o cérebro, medula espinhal e nervos. Em Mato Grosso, a taxa de feminicídios é de 1,23 mortes a cada 100 mil habitantes e representa quase o dobro da média nacional de 0,69. Ou seja, o Estado amarga no primeiro lugar como o que mais mata mulheres do país.
A advogada Larissa Guêdes, pós-graduanda em neurociência, explicou que o cérebro humano é grandemente afetado pela violência doméstica.
“Diversos estudos, tanto brasileiros quanto internacionais, mostram que a exposição contínua à violência — seja na infância ou na vida adulta — envolve uma ativação persistente do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal (HPA) e do sistema nervoso simpático. Ambos os sistemas estão diretamente envolvidos na resposta ao estresse e ficam cronicamente ativados em pessoas expostas à violência doméstica — especialmente quando a violência é contínua ou precoce (como na infância)”, explicou Larissa à reportagem.
Além disso, a exposição a episódios traumáticos desencadeia na liberação de hormônios como cortisol (do estresse), adrenalina e noradrenalina. Neurotransmissores, a adrenalina é associada à resposta ao estresse e aos estímulos de “luta ou fuga”. Já a noradrenalina controla a pressão arterial e o foco. Essas alterações hormonais impactam áreas como o hipocampo, amígdala e córtex pré-frontal, levando à redução de volume (atrofia), disfunção emocional e dificuldade de regulação do medo, controle de impulsos, atenção e memória.
“Isso significa que de fato a mulher agredida enfrenta uma maior dificuldade de regulação do medo, o que tem consequências diretas na tomada de decisão. É por essa razão que, por vezes, mesmo orientada, ela recua, ou, na grande maioria das vezes, ela sequer denuncia. Há uma espécie de sequestro da força da tomada de decisão racional por outra área cerebral que ativa o medo. Com isso, a mulher não enxerga saídas para aquela situação como as demais pessoas”, aprofundou a advogada.
Outro área afetada pela violência doméstica é a autoestima. Conforme pesquisas demonstraram, a violência ativa áreas neurais que impactam a percepção de si, o valor próprio e a autoimagem, com reflexos na autoestima, regulação emocional e autoconceito, especialmente em mulheres que desenvolveram transtorno do estresse pós-traumático.
“As regiões principais afetadas são o ventromedial prefrontal cortex (vmPFC) e o anterior cingulate cortex (ACC). Essas áreas são associadas ao processamento de emoções autorreferenciais, sentimentos de culpa ou vergonha, e à capacidade de manter uma visão positiva de si. Essas alterações estão alinhadas com a vivência de autoimagem negativa persistente, ruminação e dificuldade em manter pensamentos autoconfiantes”, completou.
REGENERAÇÃO CEREBRAL
A boa notícia é que o cérebro tem capacidade de regeneração. Isto significa que é possível sair desse “estado de alerta”. Entretanto, nem sempre o órgão se autorregula sem intervenção. Algumas práticas, como exercícios físicos praticados de forma regular, terapia e medicamentos podem ajudar o cérebro a voltar ao “normal”.
“O cérebro tende a se recuperar quando estimulamos essas rotas: corpo ativo, mente cuidada e ambiente seguro. Em muitos casos, especialmente com intervenção precoce, ocorrem grandes melhorias. Contudo, traumas intensos e repetidos podem deixar sequelas permanentes que exigem suporte contínuo. Isso porque a conexão neural criada pelo trauma é fortemente marcada pela repetição da experiência. Isso quer dizer que toda experiência humana repetida várias e várias vezes vai se automatizando, pois o cérebro é programado para economia. Até mesmo as situações ruins se naturalizam pela repetição”, afirmou Larissa.
O QUE FAZER EM CASOS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA?
A violência doméstica está devidamente tipificada no Código Penal Brasileiro e é de ação condicionada pública, ou seja, não depende da vontade da vítima para o processo continuar tramitando. Mesmo que a pessoa não queira denunciar, a autoridade pode e deve agir para protegê-la. Familiares, amigos, vizinhos podem e devem denunciar.
“A violência doméstica é crime e pode ser física, psicológica, sexual, moral ou patrimonial. Ela está prevista na Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006) que prevê a concessão de diversas medidas rápidas para que a violência cesse”´, pontuou.
Larissa, que também é advogada, elencou maneiras de se proteger nesses casos. Ela explicou que a vítima tem direito a atendimento especializado e é possível conseguir atendimento gratuito na Defensoria Pública, bem como acompanhamento psicológico e social, abrigo temporário, se necessário, e auxílio financeiro em alguns municípios.
A advogada também aconselha as mulheres a guardarem provas.
“Guarde prints de mensagens, fotos de lesões, gravações (se possível), faça um boletim de ocorrência (BO) e exija uma cópia e procure atendimento médico e peça o laudo de corpo de delito”, aconselhou Larissa Guêdes.
PROCURE AJUDA
Ligue para o 180 (Central de Atendimento à Mulher – 24h, gratuito e sigiloso);
Em situação de emergência, acione o 190 (Polícia Militar);
Você pode procurar: a Delegacia da Mulher (DEAM), Delegacia comum, se não houver DEAM na cidade, Centro de Referência da Mulher.
Medidas protetivas de urgência: Podem ser solicitadas rapidamente ao juiz pela delegacia ou Ministério Público: Afastamento do agressor do lar; Proibição de contato com você, filhos e familiares; Suspensão de porte de armas. O pedido pode ser feito mesmo sem boletim de ocorrência formalizado.
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