O poeta e artista multimídia que encantou a cuiabania com apresentações perfomáticas no auge dos anos 80, Antônio Carlos Lima, para os íntimos Toninho ou Toim, deve receber uma homenagem póstuma na Academia Mato-grossense de Letras (AML). Segundo falou com exclusividade ao HNT a presidente da entidade, Luciene Carvalho, a primeira nomeação da "Cadeira 41" deve ser direcionada ao escritor.
A líder da instituição explicou que o título é reservado a produtores literários com grande expressividade cultural que não integraram os quadros da AML, formada por 40 membros - seguindo os moldes das academias francesas. No entanto, as obras com grande valor histórico regional são dignas de tal prestígio, forçando a criação simbólica do 41º assento.
A implementação da honraria passou a ser estudada por Luciene a partir de outubro de 2023, após uma viagem para Campo Grande, em Mato Grosso do Sul. No estado vizinho, a presidente se reuniu com líderes de outras academias e conheceu a iniciativa.
O bispo emérito da prelazia de São Félix do Araguaia (1.200 km de Cuiabá) e missionário claretiano, dom Pedro Casaldáliga, e o escritor nascido em Juscimeira (157 km de Cuiabá) Antônio Sodré, mas que, assim como Antônio Carlos, sua obra ganhou pleno reconhecimento na Capital, são outras figuras cotadas para "sentar" na célebre cadeira.
"A 'Cadeira 41' é um trabalho de memória que celebra a obra de autores que morreram sem ter entrado para a Academia. É como se nós reconhecêssemos que, para além dos que receberam a pelerine, existem conteúdos literários, obras e escritos feitos que cabem ao trabalho das academias", contextualizou Luciene Carvalho.
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Toninho faleceu na sexta-feira (12), em decorrência de complicações após sofrer um acidente vascular cerebral (AVC). Luciene lamentou a despedida do amigo e escritor a quem tanto admirava. Por sua proximidade, tem conhecimento de que o poeta deixou, aos 68 anos, diversas obras não publicadas. Porém, questionada sobre a promoção de um projeto para lançar os textos, ela destacou que torná-los conhecidos é uma missão necessária, mas conceder esse lugar na instituição se faz uma tarefa para cumprimento imediato.
"Compreendo cada vez mais que a 'Cadeira 41' é urgente. Temos grandes escritores que não cooperaram no formato institucional que a Academia tem, mas estou convencida da necessidade de implantar aqui, da mesma maneira como várias academias do Brasil têm percebido. Não é uma invenção, é uma coisa que se pede. São obras que não estão na Academia, mas são tão verdadeiras que a 'Cadeira 41' se pede, se constitui", afirmou a presidente.
UM POETA À MARGEM E ALÉM DO SEU TEMPO
Toninho nasceu em 1956 no interior do Paraná, na cidade de Terra Boa. O ano é o mesmo em que o então presidente Juscelino Kubitschek editou a Lei 2.874, que anunciava a mudança da capital federativa para Brasília. Em meio a essa efervescência de acontecimentos, o paranaense cresceu cercado de histórias e se encontrou como indivíduo em meio as letras e a arte. Chegou a Mato Grosso em 1971, adotando Cuiabá como o seu lar. No período, a noite cuiabana fervilhava com o trânsito de intelectuais que deixaram seu nome nos anais da história do Estado. Por não ter certidão carimbada em Mato Grosso, enfrentou resistência para ser absorvido pela cuiabania. Mas persistiu por se entender "amigo" do movimento. Mesmo respeitador das expressões regionais, Toninho tinha o seu próprio estilo e buscava referências de fora para que pudesse ser compreendido por todos os grupos.
"Sempre fui amigo da cuiabania, mas muitos acharam que era pau-rodado. Não gosto dos temas regionalistas, prefiro universais, quero estar um pouquinho além do contexto", falou o artista no documentário "Geração Coxipó", do escritor e também imortal da AML, Eduardo Mahon.
A complexidade e a riqueza nada óbvias da produção de Toninho podem ser lidas em alguns títulos, como o livro "A! Pô! Cá! Ali! Psiu!", lançado em 2011.
Entusiasta das artes, fotografias raríssimas de suas apresentações guardadas na lembrança dos espectadores, são provas da sua ousadia artística. Nos shows da banda Caximir, grupo o qual foi um dos fundadores, Toim subia aos palcos vestido com peças feitas a partir de materiais recicláveis que se confundiam com tecidos de grande valor, após passarem por suas mãos.
O Caximir é um dos grupos que repousa sobre o imaginário popular cuiabano. A banda era formada por Toninho, Eduardo Ferreira, Antonio Sodré, Luiz Renato, André Balbino, Amauri Lobo e Luis Antonio Capilé.
O jornalista e membro da Academia de Letras, Lorenzo Falcão, outro escritor próximo do poeta, acredita que a morte de Toninho faz a cuiabania a "experimentar um vazio".
"Sua contribuição para a dramaturgia, a música, o audiovisual, o verbo, enfim suas performances inusitadas já estão fincadas em nossa memória coletiva. Por estas bandas, iniciou-se nas artes e atuou também na publicidade, tecendo com dedicação espontânea a sua trajetória.
Outsider, independente ou underground? Quem sabe uma combinação das três coisas. Serviu e há de servir por tempo indeterminado, como inspiração e exemplo para novos (e velhos) artistas", compartilhou Lorenzo com a reportagem.
NOTA DE PESAR DA SECEL
A Secretaria de Estado de Cultura, Esporte e Lazer (Secel-MT) lamentou o falecimento do poeta e ressaltou que ele foi conhecido no meio artístico além dos escritos, mas também nos pápeis de músico e compositor.
"Com profundo pesar, a Secel-MT presta condolências aos familiares e amigos neste momento de dor. A cultura mato-grossense perde uma referência", manifestou a pasta governo.
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