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Artigos Terça-feira, 04 de Outubro de 2011, 08:00 - A | A

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Terça-feira, 04 de Outubro de 2011, 08h:00 - A | A

Tulipa Negra

Nada apagará que esta foi uma morte violenta, promovida por integrantes do sistema oficial de segurança pública contra um cidadão já imobilizado. Sei também que a cor da pele de Toni exclui no momento a gravidade de tantas outras ocorrências mundo afora

HONÉIA VAZ

 

Divulgação

 

Dia 3 de outubro, 10h30, Assembléia Legislativa de Mato Grosso (ALMT). Coletiva da Imprensa com a socióloga e professora Janaína Pereira Monteiro, testemunha no caso do estudante de Guiné Bissau Toni Bernardo Silva, ex-aluno da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT). Morto no dia 23 de setembro, no bar-pizzaria Rola Papo, localizado na capital mato-grossense, Toni vem sendo colocado como personagem da bandeira da luta contra o racismo e violência, sendo uma das bases o fato de que é da raça negra (denotado pela pele) e a causa de sua morte envolve espancamento.

Em seu depoimento, Janaína esclarece que ao adentrar o Rola Papo não estava presente mais o empresário Sérgio Marcelo Silva da Costa, colocado pela imprensa como o primeiro agressor de Toni, segundo o empresário em defesa à mulher que o acompanhava, que foi o alvo da atitude suspeita do estudante, que pressupõe-se como sendo de tentativa de assalto ou agressão física, de outro lado alguns colocando como escorregão levando o rapaz a cair sobre a citada.

Alguns momentos depois, pela declaração dos próprios policiais ali presentes, a professora saberia que o marido da citada como vítima de Toni, havia se afastado do local depois de enfrentar Toni.

Saberia também que estes policiais, na verdade, eram os dois homens que ela assistia bater no estudante guineense naquele momento.

A professora descreve a cena como estando Toni “deitado no chão de bruços, as duas mãos para trás, e dois homens (os policiais), um negro, outro branco, com os joelhos nas costas dele”. Toni estava imobilizado, mas continuou apanhando e os militares informavam a ele, não se sabe se já morto ou ainda vivo, que “estava apanhando por que era bandido”.

A socióloga coloca que para ela, “bandidos eram aqueles policiais”, pela atitude presente, esclarece, apontando que deveriam ter agido profissionalmente e garantir segurança. Ela ressalta ainda que outros policiais que chegaram ao local, igualmente da PM, eram muito profissionais. “De comportamento elogiável”, definiu, abrindo para avaliação o contexto de que não se coloca uma campanha genérica contra PMs, mas em favor da observação de que há muitos despreparados para a missão da Polícia, que na minha visão de cidadã, neste caso especificamente, seria a de imobilizar Toni, deter o empresário e levar ambos à delegacia para a avaliação técnica dos fatos. É certo ainda dizer que nada isentou ainda e definitivamente, pelo menos não oficialmente divulgado, o estudante guineense de agressão à namorada do empresário.

Vale ressaltar que a socióloga Janaina, de viva voz, não condena a reação de autodefesa de qualquer pessoa comum, em proteção à sua família ou a qualquer outro agredido. Ela mesma diz ter sentido vontade de avançar fisicamente sobre os policiais para proteger o imobilizado Toni, mas deteve-se na sua fragilidade de mulher. Assim como não nega que usaria da força física para defender sua filha de um criminoso que quisesse agredi-la, hipoteticamente respondendo a uma pergunta objetiva sobre esta situação. Nesta hora ela não exclui o agressor negro, estudante, jovem (o que inclui o Toni, portanto), nem determina que há salvaguarda para os brancos em quaisquer categorias ou status, mas define que os policiais (amarelos, índios, negros e brancos, se houver os azuis também), pelo seu treinamento e função, devem saber agir em prol dos cidadãos indistintamente. A luta é para “manter a vida”, determina ela, nos dando o ponto condutor a ser revisto nas ações.

Divulgação

Longe da cena do crime, temos o contexto de vínculo estudantil. A UFMT aponta ter todos os documentos de informação oficial do desligamento de Toni Bernardo, datados de 3 de março e protocolados junto ao MEC, Polícia Federal (PF) e Itamarati para os devidos procedimentos de deportação, que não é de alçada de qualquer universidade, mas da PF. Ressalto que em convênios como este (PEC-G) o objetivo-fim não é inclusão social e entre as exigências contratuais está o “Termo de Responsabilidade Financeira” (responsabilização oficial de pessoa jurídica ou física pela subsistência do aluno no período correspondente ao PEC). No caso de Toni o valor que a família se comprometeu a enviar é de US$ 300 (e está entre os deveres constantes e previstos do aluno: recursos financeiros para se manter no Brasil, incluindo alimentação, transporte, moradia e compra de livros), atesta o assessor de Relações Internacionais da UFMT, Paulo Teixeira, e os estudantes do grupo de Guiné Bissau ainda recebiam Bolsa do MEC, “de 1 salário mínimo” . Ele explica ainda que Toni foi reprovado em 3 matérias e acumulou alto número de faltas às aulas.

É preciso colocar aqui que as cláusulas deste tipo de convênio apontam o desligamento em casos “de reprovação em mais de duas disciplinas no mesmo período”, mas ressalva a justificativa “por motivo de saúde própria”. No entanto, estabelece que pode haver desligamento também na situação de “jubilamento ou abandono de estudos”.

Teixeira informa ainda que Toni era usuário de drogas (crack) “e foi encaminhado a tratamento por meio da Coordenação de Assistência e Benefícios ao Estudante e Servidor (Cabes)”, sendo a assistência médica cláusula de obrigação da instituição enquanto for um aluno de seu quadro. “Ele abandonou o tratamento”, declara o assessor.

Dentre as tantas colocações pertinentes ouvidas, registro três, de diferentes pessoas que não somente de testemunhas oculares do crime, mas também de pessoas no entorno do desenrolar da questão, para avaliação na hipótese de crime racial ou mais uma morte violenta em uma lista de tantas e não menos hediondas ocorrências diárias: 1. “não acredito que a conotação inicial que gerou a violência contra o Toni tenha sido a cor de sua pele. Mas, o desfecho sim. Tudo começou pela atitude suspeita do Toni, mas se fosse um loiro de olhos azuis, não teriam chegado ao ponto de matá-lo espancado como aconteceu”. 2. “Havia dois homens imobilizando o Toni (os policiais), um negro e um branco. E quem batia com mais violência era o branco”; 3. “A esposa do policial branco é negra”.
Não sei determinar, precisamente e em toda a sua extensão, que tipo de crime é este e talvez sejam vários e distintos aqui. Entendo que é preciso analisar cada parte para as devidas responsabilidades dentro da Lei – de negro contra negro, de branco contra negro, de homens contra homens, de um homem defendendo sua mulher, de PMs contra um cidadão?

Mas sei que nada apagará que esta foi uma morte violenta, promovida por integrantes do sistema oficial de segurança pública contra um cidadão já imobilizado. Sei também que a cor da pele de Toni exclui no momento, e quem sabe por quanto tempo e notícias mundo afora, a gravidade de tantas outras ocorrências independentes de cor, idade, status social.

Ressalto a necessidade de treinamento por parte das empresas e organizações privadas aos seus funcionários, sobre comportamento em quadros deste tipo e tendo em conta perfis específicos (estudantes; mulheres; crianças; pontos na circunvizinhança de trânsito e consumo de drogas, etc.). Por que se Toni frequentava a localidade e constantemente era visto como “drogado” nas mesmas ruas e estabelecimentos, por várias pessoas, um aviso à polícia ou à UFMT, em alguma ocasião anterior, não poderia ter coibido o final trágico e definido um encaminhamento legal, além de evitar o ocorrido numa pizzaria da qual até então se guardava uma recordação de diversão e lazer?

Esta informação é muito bem vinda como colaboração da sociedade, não se isentando a falta de agilidade e irresponsabilidade da PF e Itamarati face à comunicação da UFMT sobre o aluno desligado. E nem deixando de enfatizar que muitos chamados à Polícia não são atendidos hoje em Mato Grosso. Sem contar que combater os agentes que criam problemas para vender (R$) facilidades à sociedade em suas mãos, e sob ameaça de algema, deve ser prioridade dos comandos, e que os cidadãos precisam entender que denunciar estas ações, ainda que anonimamente, ao governo ou via imprensa com identidade oculta, está entre nossas últimas saídas.

É fato ainda que esta terrível e atual realidade não anula os sonhos e os projetos para que, reconhecidas e firmadas orgulhosamente nossas diferenças, passemos a ser igualmente vistos e tratados pelas pessoas e organizações, pelas empresas e cidadãos, nos diferentes países e nos mais recônditos espaços, principalmente nos da auto-estima e na importância da família na construção da dignidade de seus filhos.

Inclusive no que tange ao fato de ser branco numa sociedade de negros em pleno entendimento de fortes e diversos apontamentos legais e culturais que, por vezes, incorrem mais no risco de segregar do que de fazer justiça. Sem dúvida como negro no exercício da liberdade conquistada, testando a cada passo onde realmente está sendo vítima de um opressor e por este condenado à marginal; onde se sente oprimido e marginalizado, como entendimento a cenários genéricos e nada pessoais; quando, independente da cor, e por vezes negra, realmente age como marginal e opressor contra seus irmãos ou equiparando-se a aqueles pelos quais seus ascendentes foram vitimados.

Este sonho ou projeto requer a inteireza do respeito integral aos demais seres, incluindo a si mesmo. E a quebra da soberba em que cada um de nós se acha mais e melhor, tendo como justificativa a cor, o sexo, a condição socioeconômica, o status profissional, a graduação, a nacionalidade... Quando deixarmos de fragmentar o direito do outro, e de parcializar nossos deveres, ou vice-versa, creio que não necessariamente amaremos ao próximo, mas poderemos agir mais justamente.

Acreditando que é possível, no lugar da tradicional rosa branca mundialmente elevada em protestos e mobilizações pela paz e contra a violência, quero também consagrar no meu coração a tulipa negra, em mesmo nível, beleza e status na luta por um mundo melhor. Para que eu não esqueça nunca de antes a partir de mim mesma projetar dias claramente bons e lutar para que haja igual segurança e alegria no escuro da noite.

E eu preciso realmente acreditar nisso e lutar de forma inteligente, porque mesmo não estando imobilizada como Toni, não tenho armas outras nem muita força, e a vivência dentro da crença de liberdade plena, de sujeita de direito e respeito, me condena fatalmente.

(*) HONÉIA VAZ jornalista em Cuiabá-MT e colaboradora de HiperNotícias. E-mail: [email protected]

Os artigos assinados são de responsabilidade dos autores e não refletem necessariamente a opinião do site de notícias www.hnt.com.br

 

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Salvy Bosco de Resende 05/10/2011

Parabéns: simples, profunda, ampla, genial este seu artigo, que faz pensar. Há tempos curto o que escreve, via Pacto. Mas nesse você se superou! Avante, sucesso.

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Josimar Brito 05/10/2011

Muito boa essa matéria. Parabéns para a Honéia Vaz

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2 comentários

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