A pergunta “Quem matou Odete Roitman?”, eternizada na cultura popular brasileira, ultrapassa os limites da ficção televisiva para se converter em uma poderosa metáfora sobre a condição humana e o estado contemporâneo da política e da sociedade. Por trás da curiosidade coletiva em torno do crime, esconde-se uma inquietante contradição: por que o homem, mesmo desejando a paz, é fascinado pela violência, pela destruição e pela crueldade?A pergunta “Quem matou Odete Roitman?”, eternizada na cultura popular brasileira, ultrapassa os limites da ficção televisiva para se converter em uma poderosa metáfora sobre a condição humana e o estado contemporâneo da política e da sociedade. Por trás da curiosidade coletiva em torno do crime, esconde-se uma inquietante contradição: por que o homem, mesmo desejando a paz, é fascinado pela violência, pela destruição e pela crueldade?
Sob a ótica psicológica, Sigmund Freud, em O Mal-Estar na Civilização, já explicava que a sociedade civilizada é construída sobre a repressão dos instintos agressivos. Para viver em grupo, o homem renuncia a parte de sua liberdade e dos seus impulsos primitivos. Contudo, o reprimido não desaparece — ele retorna, disfarçado, infiltrado nos discursos morais, nas pequenas violências cotidianas e nas grandes tragédias coletivas. O desejo de paz é, assim, ambíguo: o homem quer tranquilidade, mas é irresistivelmente atraído pelo caos. O noticiário sobre crimes, as disputas políticas, as polêmicas nas redes desperta um prazer inconsciente de ver o outro cair, de assistir à ruína alheia. A violência seduz, mesmo quando é condenada.
Esse paradoxo revela o que Erich Fromm chamaria de “necrofília social”, uma forma de prazer inconsciente na destruição, na submissão e na morte simbólica do outro.
No plano político, esse fascínio pela transgressão encontra terreno fértil. A sociedade que condena a violência é a mesma que idolatra líderes autoritários, que romantiza o discurso de ódio e que justifica o mal em nome da ordem.
O voto em políticos xenofóbicos, preconceituosos, homofóbicos, machistas e maldosos é uma manifestação moderna desse mesmo impulso: o desejo de ver o “outro” punido, humilhado ou excluído, sob o disfarce da moralidade e da justiça. Não é apenas ignorância política, é um prazer psíquico, uma catarse coletiva em que o eleitor, inconscientemente, delega ao líder o poder de realizar sua própria agressividade reprimida.
Assim como no mistério da morte de Odete Roitman, o público deseja descobrir o culpado, mas também quer participar da tragédia. No palco político, o eleitor torna-se espectador e cúmplice, consome o discurso violento como espetáculo, e sente-se moralmente redimido ao apoiar quem “diz o que pensa” ou “pune os culpados”.
A violência simbólica converte-se, então, em linguagem política. E o ódio, travestido de virtude, oferece uma sensação ilusória de poder, pertencimento e purificação moral. Odete Roitman, a personagem, simboliza a hipocrisia moral, o poder elitista e a frieza das estruturas sociais. Sua morte é uma catarse simbólica, uma vingança contra o poder e o privilégio, mas também revela o prazer inconsciente em destruir aquilo que se inveja ou se teme.Na vida real, a sociedade comete o mesmo gesto quando destrói seus próprios valores em nome de líderes que prometem “mudar tudo” através da força e da intolerância. É a repetição moderna da pergunta: quem matou Odete Roitman? Foi a ambição? Foi o ressentimento? Ou fomos todos nós, ao legitimar o ódio e o cinismo como ferramentas políticas?
O homem contemporâneo vive o dilema eterno entre o desejo de paz e o fascínio pelo crime. Entre o amor e o ódio, entre o ideal de justiça e o prazer de ver o outro destruído, move-se a alma humana, contraditória, ferida e fascinada pelo próprio abismo.
O assassino de Odete Roitman continua vivo em cada sociedade que confunde força com virtude, que vota pelo medo e que se deixa seduzir pela violência travestida de moralidade. Enquanto isso, o verdadeiro inimigo, a ignorância emocional e o ódio inconsciente continua à solta, dentro de cada um de nós.
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