Mayke Toscano/HiperNotícias |
Isso começa por estabelecer um diálogo permanente com a sociedade, por via direta ou por intermédio da imprensa, apresentando nossos fatos e nossas versões. Quando o interlocutor é a mídia, sobretudo a chamada grande imprensa, o desafio é maior. Como vivemos na pós-sociedade do espetáculo de Guy Debord - isto é, quando se avançou para a denúncia como modelo de negócio -, o desafio é maior. Implica um esforço para convencer o jornalista a admitir mudar sua tese, não apenas de fazê-lo ouvir o que temos a dizer.
Atualmente o ambiente é totalmente diverso daquele dos idos de 1967, quando Debord publicou A Sociedade do Espetáculo, às vésperas do movimento de Maio de 1968, que incendiou a França e o mundo. Hoje, ao contrário do passado, existe a Internet e, graças a ela, a notícia ganha instantaneamente um universo sem fronteiras, sendo replicada sucessivamente, independente de ser verdadeira ou não. Por isso, os danos são geralmente imensuráveis e exigem que os fatos se tornem efetivamente visíveis.
Foi o que aconteceu agora com o prefeito de Cuiabá, Mauro Mendes. De repente, seu nome foi envolvido em manchetes que falavam em tom ácido, acusatório: “Prefeito é envolvido em fraude de até R$ 700 milhões/ O escândalo envolve a compra de uma mineradora por uma empresa do prefeito de Cuiabá, Mauro Mendes.” Os fatos apontam na direção exatamente contrária. O prefeito nunca esteve envolvido em nenhuma fraude. Primeiro, porque a quantia de R$ 700 milhões nunca existiu. Trata-se de uma projeção, inclusive já oficialmente ultrapassada, quanto ao potencial de negócios da mineradora em foco. Segundo, quando a transação questionada foi efetuada, em 2011, Mendes não era sócio da mineradora, o que só viria acontecer no ano seguinte. Terceiro, na época Mendes não era sequer candidato à prefeitura de Cuiabá. Estes são fatos insofismáveis, porém ignorados nas espetaculosas notícias.
Falava-se também que as empresas do prefeito estavam sendo investigadas pelo Ministério Público, o que nunca aconteceu. E chegou-se ao exagero de informar, em escala nacional, que os cofres públicos tinham sido prejudicados em 700 milhões de reais. Nada mais ficcional, uma vez que se trata de negócios no âmbito privado. Um espetáculo dentro do espetáculo. Pura fantasia!
Como resolver tais impasses? Essa é uma questão que se impõe ao comunicador contemporâneo. Nossa opção foi inicialmente dialogar com os editores, reivindicando reparações, embora saibamos da dificuldade da imprensa em fazer autocrítica.
O problema central está no confronto: tese da denúncia x fatos que podem comprová-la ou rechaçá-la. E estes geralmente são deixados de lado porque a tese tende a se afirmar, independente das evidências. É um labirinto cujo fio de saída não se encontra em soluções individuais, mas na criação de canais institucionais de defesa da verdade dos fatos. Esse tem sido nosso esforço – nesse e noutros casos que envolvem a prefeitura de Cuiabá e seus representantes.
Com o tempo, todavia, a verdade aparece como o óleo na água, mas os estragos estão feitos. O modelo de imprensa baseado na denúncia acaba se trincando e perdendo credibilidade, mas a irreversibilidade das perdas está selada. Vide, entre outros, o clássico caso da Escola de Base, em São Paulo, e o Caso Índio, em Cuiabá dos anos 90.
Há outro aspecto, ainda que pormenor, que não pode passar desapercebido neste contexto: aos olhos do público – regido pela simplificação e pelo senso comum - e de setores da própria imprensa, a versão oficial é sempre suspeita, vítima de um preconceito atroz. De novo impõe-se ao jornalista o desafio de não apenas ouvir o “outro lado” e citá-lo no rodapé da matéria, apenas para legitimar sua tese, mas de admitir mudar a própria tese, quando os fatos assim o exigem. Mas, derrubar uma pauta exige mais que coragem: exige compromisso ético consigo próprio e respeito aos leitores.
São dilemas que compõem hoje os desafios e impasses da democracia e da imprensa (em geral) e da comunicação pública (em particular). Fica a experiência de viver a realidade factual de cabeça para baixo e, o que é pior, saber que ela vai se repetir, cedo ou tarde, porque a irrealidade da verdade tornou-se uma constante. A lição é educativa: no ambiente em que vivemos, tudo o que não se pode ouvir é a voz do silêncio da comunicação.
(*) KLEBER LIMA é jornalista, exercendo a função de Secretário de Comunicação da Prefeitura de Cuiabá. E-mail: [email protected]
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Ricardo Jorge 20/01/2014
Muito bom o texto. Falta só a prefeitura passar a usar o pensamento e preservar a imagem de alheia. Especialmente dos esquecidos nas filas dos hospitais...
1 comentários