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Domingo, 13 de Maio de 2018, 08h:00

Mães relatam suas histórias de determinação e amor incondicional

JULIANA ALVES - ESPECIAL PARA O HIPERNOTÍCIAS

Angelo, Ananias, Marcus e Murilo são algumas das crianças diagnosticadas com síndromes raras, doenças incuráveis ou desconhecidas e alguns já foram desacreditados pelos médicos. Porém, com determinação, força e amor suas mães lutam por suas vidas e contam as suas histórias, para que possam inspirar e ajudar outras que podem estar passando por isso.

 

Angelo

Aos quatro meses de gestação Adriana descobriu que seu bebê teve má formação. Seu filho Angelo nasceu com uma síndrome rara chamada Dandy Walker que consiste na má formação no cerebelo e Hidrocefalia que é o acúmulo de liquido na cavidade craniana. Ele tem oito anos e já passou por aproximadamente 50 cirurgias e mais de 30 apenas na cabeça.

 

“Quase todos os dias quando ele é internado, ele é desacreditado”, relatou a mãe. O Angelo nasceu prematuro e com os diagnósticos os médicos disseram que ele viveria apenas dois meses e já no primeiro mês passou por três cirurgias. Acabou ficando quatro meses internado na UTI, pois ele depende dos aparelhos de suporte vital.  Todas as vezes que ficava internado passava de 3 a 5 meses no hospital. Ele está em casa desde abril de 2017 e desde 2011 é a primeira vez que ele passa um ano completo em casa.

Alan Cosme/HiperNoticias

maes e filhos especiais

Adriana e Angelo

 

 

“A última vez que ele foi desacreditado completamente, foi em 2015. Ele estava internado e já tinha passado por várias cirurgias na cabeça. A equipe médica chamou eu e o pai dele, ele tinha 5 aninhos na época, chamaram a gente e disseram que o cérebro dele estava apresentando sinais de falência. Fizeram uma tomografia, foi uma situação que o Angelo sofreu uma lesão cerebral muito grave e ai os médicos falaram que ele estava entrando em morte cerebral. Os médicos iam manter ele sedado por morfina, mandaram preparar a família e deram no máximo 48 horas”.

 

Acabado as 48 horas, Adriana pediu que os médicos retirassem a morfina e seu filho foi reagindo lentamente e nesse novo cenário acreditaram que ele teria somente mais seis meses de vida e seria uma criança vegetativa. “Antes era uma criança que brincava e sorria muito, agora ele não seria mais essa criança. A lesão cerebral foi muito grave. Foi um processo e com o tempo ele foi voltando e recuperando as reações, hoje ele sorri e movimenta, mas é mais devagar. Ele perdeu bastante cognitivo, ele interage, mas é bem menos. Ele ficou com bastante sequelas, mas é muita convulsão, mas ainda assim dentro do que acreditaram que seria já se passaram 3 anos”.

 

 

Adriana relata que como mãe é muito difícil lidar com a primeira maternidade, que não foi planejada, e acima de tudo com todas as limitações que seu filho tinha. “Quando você descobre que a criança tem uma patologia que não tem cura você começa a conviver com o luto, de que a qualquer momento você vai perder essa criança”.

 

 

Ela disse que no começo passou por muitos julgamentos, a família passou a procurar culpados, mas mesmo com todas as dificuldades todos se envolveram para ajudar. “O mais difícil é que quando a criança nasce, a família não sabe lidar com a situação. Se sensibilizam muito e meus pais não conseguiam ver ele e as minhas irmãs também. Para todos os efeitos, todos entediam que ele estava em profundo sofrimento”.

 

Adriana relatou a dificuldade em se abrir com um psicólogo, ela não conseguia conversar sobre o assunto. Dessa forma decidiu criar o blog "Meu Angelo" que serviu como uma válvula de escape, era uma forma de desabafar e dizer o que sentia. “Eu sofria pressão dos médicos e sofria pressão da família que queria respostas. Era sempre aquilo 'ele vai andar? Vai falar? Vai comer'. Era todo mundo me cobrando, mas eram respostas que eu também não tinha e por isso eu criei o blog. E através dele eu fui conhecendo e descobrindo pessoas que tinham o mesmo problema, famílias que viviam a mesma realidade que eu. E foi a minha primeira terapia, eu posso assim dizer”.

 

Adriana fala que outras mães e pais que possam estar passando por isso, devem procurar conhecer outras pessoas que também vive essa realidade e se informar a respeito do problema do seu filho.” Quando você começa a entender o que acontece com ele, entender as limitações dele, você se envolve, você começa a se sentir útil. Quando você não sabe o que acontece, você só assiste, por que você não amamenta, você não alimenta esse filho. Ele depende o tempo todo de médico e você se torna só um espectador. Então quando você descobre, aprende sobre o que ele tem, você se envolve com pessoas que vivem essa realidade, então se torna mais suave. Você passa a fazer parte da rotina dele e não só assistir”.

 

“Sem fé é impossível superar uma sentença de morte na vida de um filho, foi dentre todas as coisas a mais importante para a minha superação”, conclui.

 

 

Ananias

Mariana é mãe do Ananias, que também tem oito anos.  Ele teve isquemia gestacional, também conhecido como acidente vascular cerebral (AVC) e isso só foi descoberto quando o bebê já tinha entre nove e 10 meses de nascido. Ananias perdeu 75% do lado esquerdo do cérebro e o lado direito sofreu sequelas. Aos quatro anos de idade ele também foi diagnosticado com autismo moderado, mais uma luta se iniciou.

 

“Os médicos deram um laudo de que ele iria vegetar, ia ficar em cima de uma cama e que era para que eu corresse atrás de todo o tratamento até os sete anos dele. Depois disso ele só desenvolveria, mas o que foi constatado naquele momento é que ele vegetaria. A primeiro momento fiquei desesperada, sem rumo”, contou Mariana que chegou a procurar um profissional que prometeu a cura por um determinado valor.

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Mariana e Ananias

 

Ela ficou desesperada atrás do alto valor solicitado pelo profissional, mas seu sogro, Ananias Vieira, não deixou que ela fizesse tal coisa, pois essa cura não existe. “Ele viu o neto como uma criança normal, neto como os outros netos. Ele viu de uma forma que outras pessoas da família não via”. Com o apoio do marido e do sogro, ela buscou profissionais que pudessem realizar a recuperação e melhorar a qualidade de vida do seu filho.

 

“A minha preocupação também era estética, por que a sociedade hoje condena tanto uma pessoa sem braço, com braço menor ou perna. Meu desespero era esse, primeiro o médico disse que ele ia vegetar, depois a gente viu que ele ia conseguir engatinhar, andar, mas ele não engatinhou. Depois de um ano e pouco ele ficou de pé e logo ele começou a dar uma caminhada. Mas foi muito tratamento, eu abri mão de trabalhar, abri mão de viagens, só mesmo pra ficar em tratamento, não podia parar. E parecia que os sete anos ia chegar a qualquer momento”.

 

Entre as medicações que o Ananias precisa uma delas custava em torno de R$1.500 e era a única fornecida pelo Governo Federal, mas ela começou a dar reações na criança. “Tenho uma neurologista que acompanha o caso e quando relatei os problemas que estavam acontecendo, ela começou a pesquisar e viu que era a medicação. De imediato pediu para suspender”.Agora ela gasta só com a nova medicação cerca de R$540 mensais.

 

Atualmente o Ananias arrasta uma das pernas, não tem o movimento das mãos, mas movimenta os braços. Ele não fala, não vai ao banheiro sozinho e toma seus vários comprimidos diários. Ele faz fonoaudiólogo, fisioterapia, ecquoterapia e participa da sala multifuncional, local onde crianças especiais tem todos os recursos para o atendimento educacional.

 

Mariana participa de vários grupos e da Associação de Amigos do Autista (AMA), local onde várias mães ligam pedindo ajuda. “Tem muita gente que pode ajudar a gente”. Ela disse que agora é uma dessas pessoas que podem ajudar e que as mães nunca devem desistir dos seus filhos.

 

“Não ache que o mundo vai acabar se não tiver o apoio da família, tem pessoas bem melhores que podem estar ajudando a gente. Por que a primeiro momento a maioria das pessoas que a gente tem convívio relatam que as primeiras pessoas que se viram é a família. Por que é difícil comprar um presente pra uma criança especial, é difícil por que as vezes você vai sair com o seu filho e você vai em um lugar, em uma festa e tem que ir embora mais cedo ou você não pode ir ou as pessoas nem te convidam. Eu falo pra pessoa nunca desistir! Nunca, nunca, nunca desistir! E tem amigos que são bem mais do que família”.

 

Marcus

Solanyara tem endometriose em grau 3 e teve dificuldades para engravidar, então Marcus é uma criança que foi muito desejada e esperada. Hoje ele tem 10 anos, mas aos cinco meses teve a primeira convulsão. Dessa forma, foi diagnosticado com a síndrome de West e a partir dali foi realizada uma investigação e foi encontrado que ele tem um complexo genético chamado esclerose tuberosa e como parte desse complexo surgiram outros diagnósticos como o autismo, epilepsia refrataria e apraxia de fala.

 

“Aos 5 meses assim que ele teve a síndrome de West, como é uma síndrome muito agressiva do ponto de vista infantil, ele teve um prognóstico muito ruim. Então a médica no momento meio que assustou a gente, ela disse que ele poderia ficar sem andar, sem se alimentar via oral, por que é uma síndrome que afeta muito a questão motora, o desenvolvimento normal”.

 

“No primeiro momento a maioria das famílias vivem o luto, eu fui pra luta na verdade. Eu vivi o luto em conjunto com a luta, por que o prognostico dele era muito ruim então eu não podia esperar. Ele fez fisioterapia de segunda a segunda, por que como ele teve a síndrome de West ele poderia não andar. Foi muito intensivo, eu tive que me dedicar muito, eu me afastei do serviço um ano e meio”.

 

Solanyara buscou apoio fora de Cuiabá e diz que procurou estudar junto com a família muito as doenças do seu filho. Diz que a fonoaudióloga de Cuiabá foi essencial, pois ela tinha um paciente com o mesmo diagnóstico, foi um conhecimento a mais. “A mãe sofre muito, meio que tudo cai sobre a mãe. As coisas que eu falava do Marcus, as vezes a família não entendia. Sempre acham que a gente está exagerando”.

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Solanyara e Marcus

Marcus sempre frequentou a escola regular, mas em 2016 precisou realizar em uma cirurgia neurológica em Campinas (SP) e decidiram retirar ele da escola, porém atualmente ele recebe atendimento domiciliar. Ele permanece matriculado na escola, mas a professora vem em sua casa e aplica o conteúdo. Solanyara conta que como o autismo não tem cura, as terapias e os estímulos são para a vida toda. Seu filho realiza atividades como natação, tem psicóloga e fonoaudióloga.

 

Ela defende que a primeira atitude que uma mãe que se depara com essa situação deve tomar é estudar, buscar informações qualificadas e não ficar só no que encontra na internet. Buscar outros centros de tratamento, estudar se o tratamento que está sendo realizado no momento é o correto. “Então assim, a informação e a busca de outras famílias com o mesmo diagnóstico ajuda muito. Eu acho que no momento que eu falei nessa questão da luta, foi justamente isso. Nós fomos estudar, fomos buscar outros profissionais, atrás de famílias com o mesmo caso. Isso dá um certo direcionamento, nós tivemos esse direcionamento”.

 

Diz também que essa criança precisa de muito estímulo e que os pais precisam dedicar muito do seu tempo e que é desgastante, mas ao mesmo tempo serve para ver que o seu filho que teve um prognostico ruim hoje anda, corre e pula. “É algo que você vê que valeu muito a pena toda a dedicação. Tanto dos profissionais, quanto a nossa”.

 

Aponta que uma das coisas mais importantes é acreditar nas crianças. “Ver a criança além do diagnostico que ela receber, se a gente ficar focado só no diagnóstico a gente acaba perdendo e desacreditando na pessoa, na criança. Então é importante acreditar na potencialidade dessa criança e investir, fazer os investimentos necessários com estimulo e com muito amor. Então acho que o mais importante de tudo que falei é isso. Acreditar! Acreditar no outro, acreditar no potencial e enxergar e ver o outro além do diagnóstico”.

 

Murilo

Fernanda estava gravida de sete meses quando seu filho foi diagnosticado com microcefalia, ele nasceu e ficou oito dias internado na UTI. Ela morava em Pontes e Lacerda (distante 450 km de Cuiabá) e decidiu se mudar para a capital buscando uma qualidade de vida para o seu filho Murilo, que hoje tem um ano e nove meses.

 

A primeira pergunta que ela fez a médica foi qual era a possibilidade dele nascer com vida e a médica respondeu que era a mesma do que qualquer criança sem alteração. “Mas quando eu descobri fiquei uma semana sem querer falar com ninguém e queria ter um tempo pra mim digerir a situação. Mas foi muito rápido, nós não nos deixamos nos abater. Tivemos nosso período de luto que foi uma semana de aceitação”. 

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Fernanda e Murilo

 

“Quando se dá o diagnóstico de microcefalia a gente não conhece e é um impacto muito grande, por que não sabemos o que tem pela frente e a gente não entende o que é, como é, qual é a dimensão da situação, então a gente fica com medo, fica receoso. Ai a gente vai na internet e só acha coisas ruins e matérias de crianças da pior forma, na pior situação”. Atualmente ele é uma criança saudável e nunca foi desacreditado, faz fisioterapia, frequenta fonoaudiólogo e faz outras atividades que precisa.

 

Fernanda conta que não existe muito apoio para as mães nessa situação, então elas decidiram se ajudar. “Unidas pelo amor” é um grupo no aplicativo WhatsApp, onde mães que tem seus filhos diagnosticados com microcefalia serve como apoio nas dificuldades e trocam experiências para ajudar umas às outras e nasceu justamente por que muitas mães não conhecem a doença e o preconceito que existente em volta dela.

 

Ela diz que tudo passa, no começo tudo é complicado, não se sabe o que está por vir e o que vai acontecer, mas uma coisa que ela acredita é que o hoje deve ser vivido. “Vamos viver o hoje e amanhã a Deus pertence. Então se você pode amar hoje, ama hoje. Por que eu não sei o amanhã e foi isso que decidimos na nossa casa. Decidimos amar o Murilo intensamente hoje e amanhã de novo e depois de novo. Por que passa muito rápido e eu não sei se amanhã vai estar aqui do jeito que está, então a gente tem que amar, o amor é a cura de todas as coisas. Eu sempre falo, o amor cura. Tudo passa e a gente tem que viver o hoje. Não adianta você se preocupar com daqui um ano ou 10 anos, por que a gente não sabe o futuro de ninguém e o deles também não. De repente eu posso morrer antes do meu filho, mas pela lógica a gente já cria um consciência de que não vai ser assim, que ele vai antes de mim”.