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Segunda-feira, 04 de Abril de 2011, 16h:15

Mato Grosso ainda vive era do império em matéria de regularização fundiária

Intermat ainda usa papel vegetal em cartografia, em plena era de georeferenciamento digital

LUIZ ACOSTA

 

Assessoria/Intermat
Afonso Dalberto, presidente do Intermat, entrega título de propriedade: sobreposição ainda é problema em MT
Mesmo com todo avanço tecnológico, Mato Grosso enfrenta um grave problema que se arrasta desde os tempos do império: a regularização fundiária. A falta de uma base cadastral única e confiável no órgão responsável pela legalização de áreas, o Instituto de Terras de Mato Grosso (Intermat), continua ocasionando problemas que há muito tempo deveriam ter sido superados, como por exemplo, a sobreposição de títulos definitivos de propriedade.

 Técnicos do órgão admitem que as falhas continuam ocorrendo e que faltam elementos, como ponto de amarração na medição e demarcação de áreas, obtidas pela utilização de aparelhos rudimentares nesse trabalho. Esses contratempos já deveriam estar superados há muito tempo, uma vez que existe hoje no mercado equipamentos de precisão de última geração como o GPS (Global Position Sistem), além do georreferenciamento, que hoje é uma obrigação imposta ao proprietário rural em decorrência da Lei nº 10.267/2001.

O exposto acima é uma realidade que, infelizmente, ainda impera em nosso Estado e que tem a anuência dos gestores do Intermat, uma vez que são eles que autorizam e emitem toda a documentação necessária ao registro ilegal dessas áreas.

O lucro fácil da especulação imobiliária é um dos motivos principais que leva à prática da sobreposição de títulos e isso vem ocorrendo na periferia de Cuiabá, na saída para Chapada dos Guimarães, região que vem experimentando uma “explosão” ocupacional nunca antes vista, com o surgimento de vários condomínios residenciais destinado às classes média e alta.

A sobreposição de título em uma área de 59,0497 hectares, denominada “Lagoa Azul”, existente na Rodovia Emanuel Pinheiro, em frente ao restaurante Reserva e ao bar DNA da Cerveja, distante cerca de cinco quilômetros do trevo do Jardim Florianópolis, é um exemplo disso, uma vez que foi titulada oficialmente no dia 9 de julho de 2008 e registrada no Cartório do 7º Ofício, em Cuiabá, com a matrícula nº 23.194.

A área já consta da base cadastral e está na relação de títulos definitivos, onde constam também a planta de localização dos lotes e a matrícula. Embora não exista nenhuma benfeitoria na “Lagoa Azul”, o título existente está em nome de Clarindo Epifânio da Silva e foi sobreposto pelo emitido em favor de Ilma Pereira Ramos, uma senhora humilde que, suspeita-se, tenha sido usada como “laranja” para expedição do documento. Morando na periferia Norte de Cuiabá, Ilma Pereira foi procurada pela reportagem, mas não soube dar detalhes da área.

Há ainda denúncia de alguns funcionários do próprio Intermat de que houve pagamento de propina para titulação e liberação da área de 59,0497, que já estaria sendo negociada com um grupo de São Paulo por algo em torno de R$ 7 milhões, e que teria como destino a divisão em terrenos para formação de condomínios residenciais. Porém, ao fazer a checagem no Cartório de Registro de Imóveis, teria descoberto a sobreposição e recuado na intenção de compra da área.

Pela planta, a área desmembrada da propriedade de Clarindo Epifânio da Silva foi “cortada” pela pista da rodovia Emanuel Pinheiro, inclusive a duplicação que foi feita pelo governo do Estado, o que a torna passível de indenização pelo Instituto de Terras de Mato Grosso. Outro desmembramento também teria ocorrido no lote 128, cuja proprietária original é Benedita Amélia dos Santos Rosa.

A denúncia já foi encaminhada à Comissão de Regularização Fundiária da Assembléia Legislativa, que está analisando o que de fato ocorreu naquela área de terra e identificando os verdadeiros proprietários e os que armaram esse golpe para obterem lucros altíssimos.

OUTRO LADO

O assessor jurídico do Intermat, Marco Túlio de Araújo, confirma a sobreposição de títulos na área, porém, lembra que esse é um problema que vem desde o império e que ainda persiste em Mato Grosso. “O Estado não tem uma base cartográfica confiável e digitalizada. Toda nossa base ainda está no papel vegetal e estamos trabalhando para que até junho ou julho tenhamos essas peças digitalizadas para evitar esse tipo de problema, uma vez que as regiões de Mato Grosso possuem mais de uma carta (mapa) e as informações de uma mais antiga pode não estar na mais recente o que acaba causando esse problema”, explica.

Marco Túlio explica que, no caso da “Lagoa Azul”, existe ainda um outro título que sobrepõe ao de Clarindo Epifânio da Silva e que, tanto para essa área, como para as demais onde forem detectadas as sobreposições de títulos, a solução seria reconhecer o documento de quem está na posse da terra e não dos outros títulos existentes, cujos proprietários, muitas vezes, nem moram em Mato Grosso.