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Quinta-feira, 02 de Junho de 2011, 19h:33

Um estelionato federal

Nesses dez anos de existência da CIDE já entregamos ao Governo Federal mais de R$ 66 bilhões, o que seria suficiente para termos rodovias de primeiro mundo. Daria, praticamente, para duplicar a atual malha rodoviária federal

WALDIR SERAFIM

 

Divulgação

 

Em 2010, como faz todos os anos, desde 1995, a Confederação Nacional dos Transportes (CNT), fez uma pesquisa sobre a situação de trafegabilidade das rodovias brasileiras pavimentadas. Abrangeu todos os estados brasileiros, numa extensão de 90.945 km (61.851 km de rodovias federais e 29.094 km de rodovias estaduais).

O resultado da pesquisa deixou claro que nossas rodovias pavimentadas deixam muito a desejar. Apenas 41,2% estão avaliadas como ótimo e bom, o restante está em situação: regular 33,4%; ruim 17,4% e péssima 8,0%.

A situação só não é pior porque nas rodovias concessionadas (14.552 km, correspondente a 16% da extensão pesquisada), 87,3% estão em ótimo ou bom estado de conservação. As rodovias sob a administração pública, ao contrário, estão com indicador de ótimo e bom em, apenas, 32,4% de sua extensão. As rodovias concessionadas são aquelas que estão com administração privada e pedagiadas.

Não é por acaso, que o Estado de São Paulo é o que está em melhor situação, segundo a pesquisa (81,2% entre ótimo e bom), pois é naquele Estado que está a maior extensão de rodovias concessionadas. Mas também as que têm os pedágios mais caros do país.

No Estado de Mato Grosso, a pesquisa mostrou um resultado nada favorável. Dos 4.849 km pesquisados (4.182 km de rodovias federais e 667 km de rodovias estaduais), apenas 23,1% estão classificadas como ótimo ou bom. Aliás, nossas rodovias estão entre as piores do país, só melhores que as do Acre, Amazonas, Pará, Amapá e Ceará.

Este é apenas um lado da questão. O outro lado se refere ao fato de que nós, espoliados contribuintes, pagamos para ter rodovias de boa qualidade e, no entanto, somos obrigados a conviver com a maioria de qualidade sofrível.

Em 2001, ainda no Governo FHC, foi criada a Contribuição sobre Intervenção no Domínio Econômico, também conhecida com “CIDE-combustível”, cujo fato gerador é a importação e a comercialização de petróleo e seus derivados, gás e álcool etílico. Trata-se de um valor cobrado a cada vez que abastecemos nossos veículos. Atualmente, para cada litro de gasolina entregamos ao governo federal, R$ 0,23 centavos. A garfada do leão já foi maior, já chegou a R$ 0,50 por litro e, por lei, pode chegar a R$ 0,86.

A finalidade principal da CIDE, conforme justificativa do Governo à época, era o financiamento de projetos de infra-estrutura de transportes e meio-ambiente. Era, porque não é isso que tem acontecido. Os recursos da CIDE são desviados, sistematicamente para composição do Superávit Primário e utilizado para pagamento dos juros da dívida pública.

A coisa funciona assim: o governo não pode gastar os recursos em outras finalidades, mas também não é obrigado a gastá-los para atender aos objetivos para os quais foi criado.

Nesses dez anos de existência da CIDE já entregamos ao Governo Federal mais de R$ 66 bilhões, o que seria suficiente para termos rodovias de primeiro mundo. Daria, praticamente, para duplicar a atual malha rodoviária federal de pouco mais de 60.000 km, porém o que recebemos em troca é uma vergonha. Sem comentários.

Pagamos e não levamos. Isso, no mundo jurídico, tem um nome bem apropriado: estelionato.

Enquanto isso pessoas estão morrendo ou sendo mutiladas em nossas estradas. Somente em 2010, foram 8.516 vidas ceifadas em acidentes nas estradas federais, número 15,4% maior do que 2009.

(*) WALDIR SERAFIM é economista em Mato Grosso e colaborador de Hipernoticias. E-mail: [email protected]